quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Até Deus duvida

Título: Até Deus duvida
Autor: Lêda Selma
Páginas: 170

Gosto muito de crônicas, é um estilo que considero descompromissado. É como se fosse um bate-papo, uma conversa informal sobre assuntos corriqueiros e sem muita importância. E, como são textos pequenos e não sequenciais, podem ser lidos em pequenos intervalos.

O livro em questão apresenta várias crônicas e quase todas humorísticas. A autora cria palavras e nomes próprios que são, no mínimo, risíveis. Onde já se viu "Distraildina", "Pescanildo", "sorveteu", "bombrilesca", "impeixíferas", "Bigolândia", "Doidivino", "cachorrólogo" e por aí vai. Em suma, uma leitura agradável.

Trechos interessantes:

"É notório que ele [computador], às vezes, tumultua nosso relacionamento, ao insistir em intrometer-se nos meus escritos (que mania danosa!). Contudo, ignoro tal ousadia e coloco-o em seu devido lugar. E tenho razão: o abelhudo recusa, substitui minhas palavras e, ainda por cima, sublinha-as de vermelho. Vê-se que o tal ignora a liberdade dos textos literários. Resultado: ficam todos carnavalescos, fantasiados. Tenho culpa se o fulano é deficiente semântico, ou se é pobre seu vocabulário conotativo?!" (pág. 17)

"A mesma sorte não teve a pera, que pela de medo dos pelos daquele bigode sobre a boca que a abocanha. Entenderam?! Ih! os conhecidos pares pára/para, pêlo/pelo, péla/pela, pólo/polo não têm mais o diferencial, mas o "têm", no plural, tem, como sempre." (pág. 20)

"De forma que, a certa altura da prosa, ninguém se aventurava a sequer uma retirada rápida, para acalmar as súplicas das necessidades mais íntimas, naturais e intransferíveis. Por puro medo de ser o próximo candidato a frangalho naquelas bocas debochadas e sem trinco." (pág. 44)

"-Transviarei o que meus antepassados sempre disseram: 'É melhor ouvir bobagem do que ser surdo'. Não, não, não, não é! Pela minha batina, ó Deus protetor dos ouvidos insultados, a surdez, por misericórdia!" (pág. 68)

"A verdade nunca o intimidava, principalmente a verdade dos outros. O que tinha a dizer, dizia, assim, de chofre. A verdade era encomenda que ele não deixava ninguém entregar ao destinatário. Fazia-o de própria boca. Sem retoques nem depois." (pág. 78)

"-Senão, o quê?! Me diga, delegado, o quê? O senhor pensa que vou aceitar que escorchem os meus direitos, é?
- (Escorchem... Que diabo é isso? Ah! não: bandido intelectual...?!)" (pág. 125)

"Que outro jeito, filho, senão recordar!? O irreversível, aprendi, é passagem sem ponte, é rio intransponível e sobre o qual não se pode navegar." (pág. 169)

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