domingo, 9 de agosto de 2020

A monja e o professor

Título: A monja e o professor
Autor: Monja Coen e Clóvis de Barros Filho
Páginas: 128
 
 O livro é uma reflexão sobre ética e valores, sendo estes temas explanados pela Monja Coen e pelo professor Clóvis de Barros. A riqueza de detalhes e a profundidade dos temas analisados são cativantes e, sendo explanados com singeleza, torna o entendimento muito mais simples.

 Minha opinião pessoal é que o livro se apresenta mais com mini palestras de cada um dos autores. Cada um destrincha um tema até se esgotar só aí o outro entra com sua participação. Imaginava que o livro seria mais como um diálogo simples entre as partes, mas a forma apresentada não compromete o resultado.

 Trechos interessantes:

 O que é ser feliz ou estar feliz?
A raiz da palavra “feliz” é a mesma de “fértil”, “frutífero”. Mas o que é ser feliz ou estar feliz?
O que você faz, fala, experimenta, vive, decide, escolhe, pratica, estuda, ensina, educa, alimenta, veste, medica, cura, traduz, escreve, lê, assiste, pensa, medita, ora... todas as ações e atitudes do seu dia a dia seguem princípios éticos? Você procura se aperfeiçoar, dar o seu melhor mesmo nas coisas mais simples da vida? (pág. 12)

O que seria excelência? Seria, justamente, ao longo da vida, tirar de si mesmo, em forma de performance, de conduta, de comportamento, de disposição, o que a natureza permitiria de melhor. (pág. 19)

Conhecer a nós mesmos em profundidade é conhecer a vida em suas múltiplas formas. É respeitar a vida de tudo que foi, é e virá a ser. É saber que somos a vida da Terra e que somos mantidos vivos por todas as outras formas de vida. (pág. 37)

Agora, veja que interessante, monja. A mesma pessoa que diz que não podemos perder a oportunidade não aceitaria a pecha de oportunista. Não parece um contrassenso? Porque, se não posso perder oportunidades, só poderia ser um oportunista, ou seja, colocarei a oportunidade acima de qualquer outro valor. E o que é a oportunidade? É não deixar escapar uma situação que possa trazer vantagem para si ou para o grupo, o coletivo ao qual pertenço. (pág. 55)

Você poderia perguntar: “Mas me dê algum fundamento para o valor da fidelidade.” O fundamento é este: tinha alguém ouvindo. O fundamento está no outro e na consequência mais imediata da fidelidade, que é a confiança. Ou seja, você costurará relações de confiança se, e se somente se, puder ser fiel. Agora, se agir de maneira infiel, aproveitará todas as oportunidades, mas não cobre daqueles que foram largados, traídos, decepcionados que voltem a bater à sua porta. Não exija deles o que não é mais possível exigir, porque você estilhaçou um vaso que não pode ser colado de volta, que é o vaso da confiança em você. (pág. 58)

Veja que interessante: o respeito ao passado, que é a própria fidelidade, é a condição do respeito ao futuro, que é a sustentabilidade. Quer dizer, não agir hoje de maneira a colocar o amanhã em dificuldade. Não ganhar tudo o que puder se esse ganho comprometedor o ganho de amanhã. (pág. 59)

 Não tenho medo de um Deus que possa me julgar e me condenar. Sou eu que vejo, sou eu que julgo, sou eu que me aprovo ou me condeno. Sou eu que sou fiel ou infiel aos meus princípios. Esses valores já existiam na sociedade, mas fui pescando aqueles que me formariam. (pág. 63)

Certa vez uma senhora, cujo filho estava com diabetes, pediu a Gandhi que recomendasse ao menino não comer açúcar, porque ele o respeitava. Gandhi disse: “Volte daqui a um mês.” Ela voltou depois de um mês. Gandhi se virou para a criança e falou: “Não coma açúcar.” A mãe perguntou: “Por que o senhor não falou isso um mês atrás?” E ele respondeu: “Porque eu ainda comia açúcar.” Aqui há coerência. (pág. 67)

 Quando comecei a prática em Los Angeles, uma vez fui a um zazen para iniciantes, uma aula de meditação. O monge que dava a aula comentou o seguinte: “Quando estava vindo para cá hoje de carro, de repente senti muita vontade de tomar sorvete. Olhei em volta e vi uma menininha tomando sorvete. Eu havia feito um bom café da manhã. Não precisava de sorvete. Percebi que havia entrado na emoção da menina.” E ele continuou: “Quantas vezes fazemos algo sem perceber que não era a nossa vontade, nossa necessidade naquele momento?” (pág. 78)

Então, antes de me perguntar “O que é moral?”, responda: “O que eu devo fazer?” A moral responde à pergunta: o que eu devo fazer? Agora, a moral existe para me fazer feliz? Não. A moral existe para atender aos meus interesses? Não. A moral existe para me proteger das ameaças da civilização? Não. A moral nada tem a ver com polícia, com tribunais, com egoísmo. São princípios que livremente decidi respeitar. São leis que, como legislador de mim mesmo, decidi respeitar na soberania de minha vida. Olhe só que loucura! Em outras palavras, o bom comportamento de uma pessoa não é exclusivamente definido pelo medo que ela tem de ser punida. O bom comportamento não é determinado pela presença de uma câmera fiscalizadora, de uma tornozeleira eletrônica. O bom comportamento não tem a ver com o crachá eletrônico, com as roletas, com os seguranças, com os elevadores inteligentes e tudo aquilo que nos cerceia. O bom comportamento de uma pessoa pode ter a ver só com ela mesma. É o que chamamos de moral. Pág. 86/87)

Você quer ter um carro. Legal! Tenha o carro, aprecie o carro. Que gostoso andar de carro! Mas não deseje o carro do outro. Você poderá ter o outro também, mas, no momento, aprecie o que já tem, que é sua vida, que é este momento, e ele está passando, está correndo. E não adianta você querer apressar ou querer que seja prolongado: o tempo não se prolonga. Tudo está em transformação incessante. E nós somos essa transformação, nós agimos. O que você faz, fala, pensa, reflete em tudo. (pág. 96)