terça-feira, 7 de novembro de 2017

Simples assim

Título: Simples assim
Autor: Martha Medeiros
Páginas: 238

Martha Medeiros é uma das cronistas mais conceituadas do país. E não é para menos, suas crônicas são simplesmente fantásticas, revelando humor, indignação, euforia, entusiasmo, revolta, tudo na medida certa. Qualquer que seja o assunto a ser discutido, ela sempre tem uma palavra afiada e certeira.

Várias são as crônicas do livro que eu considero destaques, mas, duas especificamente chamaram a minha atenção. São crônicas que reforçam a diferença gritante entre o Brasil e os países realmente de primeiro mundo, onde a cidadania está em primeiro lugar, ao invés de lucros e propinas. Para mim, os destaques são: "O galão d'água" e "Simples assim".

Trechos interessantes:

"Da série 'Morro e não vejo tudo': cerca de 200 mil pessoas de mais de 120 países se inscreveram para participar do programa de assentamento em Marte, projeto elaborado pela organização holandesa Mars One. Os brasileiros ficaram em terceiro lugar em número de inscritos - perderam apenas para americanos e chineses." (pág. 11)

"Ele [Bansky] defende o grafite como uma arte honesta e popular. Diz que é uma resposta aos milhares de anúncios publicitários estampados em painéis gigantescos por toda a cidade, inclusive nas laterais dos ônibus: por que todos aceitam que a cidade se desfigure com publicidade e não com o grafite artístico? Ele mesmo responde: porque as pessoas não sabem reagir diante do que não gera lucro." (pág. 27)

"...você não é o que você faz para ganhar dinheiro, você é o que você faz para ser feliz." (pág. 30)

"Não odeio filas porque não odeio nada, mas não é um acontecimento pelo qual eu anseie. Fila, para mim, é a representação máxima da perda de tempo, e tempo é algo que valorizo mais do que pérolas, jades, rubis." (pág. 57/58)

"Pessoas viajam pelo mundo para conhecer monumentos, comer, comprar. A atenção geralmente é voltada para o que se pode fotografar com a câmera e administrar com o bolso. A Tailândia e o Camboja são realmente fotogênicos. Quanto às compras, o mundo virou um supermercado gigante e o que se comercializa lá é vendido aqui também, compra-se mais por impulso do que pela novidade. O que não se globalizou (ainda) é o espírito do lugar, e isso é que verdadeiramente encanta: a reverência que não é submissão, mas respeito. O silêncio que não é timidez, mas educação." (pág. 64)

"Quanto mais se grita e esperneia por aí, mais atenção eu dou aos singulares que brilham em voz baixa."(pág. 116)

"Tudo que dá errado pode dar muito certo. A vida joga os dados, distribui as cartas, gira a roleta: a nós, cabe apenas continuar apostando." (pág. 118)

"Um policial em cada esquina. Nota fiscal entregue em todas as transações comerciais. Lixeiras por toda parte. Ruas bem sinalizadas. Transporte farto, barato e que cumpra horários. Hospitais com vagas dia e noite. Escolas eficientes. Confiança em vez de burocracia. Sinceridade em vez de enrolação. Agilidade em vez de empurrar com a barriga. Se todo mundo concorda que é assim que tem que ser, por que não acontece, quem emperra?" (pág. 141)

"Estava descendo uma ladeira do Chiado, em Lisboa, quando passei por um mendigo. Seria mais um entre tantos que ocupam as calçadas, mas percebi que ele estava cercado de cartazes dizendo que a esmola iria para o uísque, o vinho, a cerveja, a ressaca. Um mendigo engraçadinho. Fiquei observando. Os turistas passavam, riam e distribuíam moedas não por caridade ou desencargo de consciência. Era couvert artístico." (pág. 176)

"Te tornarás só quem tu sempre foste. O que os deuses te dão, dão no começo." [Fernando Pessoa] (pág. 188)

"Uma coisa é se manifestar - inclusive com humor - a fim de pressionar pelo fim da impunidade. Demonstra amadurecimento da população. Mas no momento em que chamamos a presidente de vaca, fazemos brincadeiras sórdidas alusivas ao rosto de Cerveró ou culpamos o PT pelo espirro do cachorro do vizinho trocamos a maturidade da nossa imaginação por um bullying coletivo que mais revela nossa pobreza de espírito do que grandeza como nação." (pág. 206)

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