quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

Máximas e mínimas do Barão de Itararé

Título: Máximas e mínimas do Barão de Itararé
Autor: Afonso Félix de Sousa (org.)
Páginas: 188

Nada melhor que encerrar o ano dando boas gargalhadas. Para isto lancei mão do livro que apresenta os ditos e a sabedoria popular de Apparicio Torelly, mais conhecido como Barão de Itararé.

Apparicio era gaúcho, mas se destacou no Rio de Janeiro onde fundou e manteve por algum tempo um semanário, chamado A Manha, que satirizava a política e a sociedade brasileiras. Suas frases, quase sempre de cunho humorístico, são conhecidas até hoje pela maioria do povo brasileiro. Boas risadas e boa leitura.

Trecos interessantes:

"'Os vivos são sempre e cada vez mais governados pelos mortos' - dizia Comte. Itararé não se conforma e responde: 'Os vivos são sempre e cada vez mais governados pelos mais vivos'." (pág. 21)

"De onde menos se espera, daí é que não sai nada." (pág. 27)

"Quando o queijo e a goiabada se encontram na mesa do pobre, devemos suspeitar dos três: do queijo, da goiabada e do pobre." (pág. 29)

"O rapaz ia casar-se e, sendo católico, foi confessar-se. Tendo contado vários pecados, o padre, ao fim de tudo, o absolveu.
-Mas, Padre Júlio, não me dá nenhuma penitência? - estranhou o jovem.
-Pra que, meu caro. Você já vai casar-se..." (pág. 57)

"Depois do governo ge-gê,o Brasil terá um governo ga-gá." (pág. 65)

"-Como ia dizendo, meus senhores, o banco é uma instituição que empresta dinheiro à gente se a gente apresentar provas suficientes de que não precisa de dinheiro..." (pág. 74)

"Sabendo levá-la, a vida é bem melhor do que a morte." (pág. 115)

"O trabalho nobilita o homem, mas depois que o homem se sente nobre não quer mais trabalhar." (pág. 123)

"O automóvel particular é o maior abacaxi para atrapalhar a vida dum cidadão. Se o dono do carro tem chofer, nunca poderá sair à hora que quiser, pois o cinesíforo nunca está na hora em que se precisa do automóvel. Se é o dono quem guia a caranguejola, então a coisa é muito pior, pois a vítima nunca encontra um lugar vago para colocar o seu carro. O remédio será soltar o veículo em qualquer lugar distante e caminhar a pé até o lugar onde se desejaria estacionar." (pág. 143)

terça-feira, 30 de dezembro de 2014

Visões noturnas

Título: Visões noturnas
Autor: Maurício Caldeira
Páginas: 366

O meu primeiro impulso ao ler o livro foi porque se tratava de contos, gênero que aprecio. Mas tinha receio devido à classificação do livro: terror. Nunca fui fã de terror, mortes sangrentas, sustos e nem nada parecido.

Mas tive uma ótima surpresa: eu não chamaria o livro de terror, mas, na minha concepção, são contos de mistério. Aqueles contos que desafiam a lógica natural das coisas, que apontam para o desconhecido e apenas flerta, de leve, com o terror. Ou seja, para mim foi um achado: 12 contos, cada um melhor que o outro. meus preferidos: 'A viagem' e 'Lado B'.

Trechos interessantes:

"É impossível entrar em um cemitério e não pensar na frase 'Eis aqui o fim de tudo', assim como, quando vamos a um velório, nos imaginamos dentro do caixão, cobertos por flores, com as mãos cruzadas sobre o peito e com pequenos tufos de algodão tapando as narinas." (pág. 39)

"O processo da morte, no entanto, é curioso. A tristeza imediata dá lugar, aos poucos, àquilo que chamamos de saudade. Os anos, no entanto, passam; os verões vêm e vão, e logo a pessoa que morreu é literalmente esquecida. Isso é inevitável. Será lembrada de vez em quando, talvez uma, duas vezes por ano, no máximo, da mesma forma como lembramos de um amigo de infância com quem perdemos contato. Essa é uma das regras da vida: seja útil enquanto está vivo, porque depois ninguém se lembrará de você." (pág. 62)

"-Porque é assim que deve ser. As pessoas devem querer viver, e não morrer. A morte deve ser encarada como uma perda, e não como uma vitória. As pessoas devem amar a vida e lutar para permanecer nela o maior tempo possível. E eu gosto muito quando encontro uma pessoa que ama a vida - disse Auriel, novamente em tom de orador." (pág. 78)

"O ser humano persegue o dinheiro e, quando o alcança, descobre que não se pode comprar tudo. Persegue o amor e, quando o alcança, acha que 'dois amores' são melhores do que somente um. O ser humano, enfim, só faz merda..." (pág. 97)

"A verdadeira loucura está na total normalidade. Uma pessoa normal vê uma desajustada como louca, mas o contrário também acontece." (pág. 112)

"-O dinheiro pode comprar muitas coisas, Denis. Mas as coisas mais importantes ele não compra. O dinheiro só compra o material e o material só traz felicidade momentânea. Em poucos minutos sua mente já abandonou aquela necessidade e já mira outra coisa ainda maior." (pág. 115)

"As pessoas devem achar que o céu é uma grande reunião de advogados, pois quase todos são enterrados vestindo um terno. Por que não uma camiseta? Ou bermudas." (pág. 139)

"Quando se tem um inimigo, o mais prudente a fazer é conhecê-lo a fundo. É muito importante conhecê-lo em cada ponto, em cada detalhe, e estar sempre uma jogada a frente, em caso de haver necessidade de enfrentá-lo cara a cara.
Isso tudo soa muito bonito, mas é praticamente uma regra o fato de que o inimigo parece estar sempre duas jogadas a nossa frente." (pág. 162/163)

"Pela primeira vez na minha vida, eu ficaria internado. Aquilo me assustou. Não era um hotel, era um hospital! E eu passaria a noite nele. Não só aquela noite, mas provavelmente algumas. Passaria a noite em um local onde pessoas morrem a toda hora. Não pela morte em si. Como eu disse, eu era ateu. Mas até hoje acho estranho os médicos quererem que você melhore, lhe colocando em um local onde as pessoas morrem todos os dias." (pág. 228)

"Para mim, a morte sempre havia significado um nada. Um nada que representava o apagar das luzes, o fim de tudo, uma espécie de ato final. Em um instante, a pessoa estava ali; no instante seguinte, já não estava mais. Porque é exatamente esse o tempo que a morte dura: um instante.
Em um instante a pessoa tem vontades, desejos e sonhos. Gosta de viajar, gosta de comer cebola crua, gosta de assistir TV até tarde. No instante seguinte, não passa de um amontoado de carne e ossos, cuja única função biológica é apodrecer e decompor-se. Como na natureza nada se perde e nada se cria, podemos dizer que aquela pessoa será reaproveitada em algum momento; uma espécie de reciclagem natural." (pág. 237)

"Esse é um dos pontos negativos de se viver demais. Você vê as pessoas ao seu redor falecer, enquanto você vai ficando, ficando e ficando, até que a morte lembre-se de você..." (pág. 265/266)

segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

Do amor e outros demônios

Título: Do amor e outros demônios
Autor: Gabriel García Marquez
Páginas: 222

Um antigo convento foi destruído para liberar espaço para a construção de um hotel. Ao esvaziarem as criptas funerárias encontraram uma cabeleira de 22 metros. Informado que o cabelo continua a crescer, mesmo depois da morte, o autor, considerando o fato inusitado, resolveu elaborar a sua versão da história de vida da dona da cabeleira.

Assim surge a história de Sierva María, filha do marquês local e que se identificava mais com os escravos que com seus familiares. Ignorada pelo pai e desprezada pela mãe, acaba indo parar num convento e passa a ser considerada como possuída pelo demônio.

Trechos interessantes:

"Não praticava a cirurgia, que sempre considerou uma arte inferior, própria de curandeiros e barbeiros, e sua especialidade aterradora era predizer para os enfermos o dia e a hora em que iam morrer. Contudo, tanto a sua boa fama quanto a má se baseavam num mesmo fato: dizia-se, e ninguém jamais o desmentiu, que tinha ressuscitado um morto." (pág. 31)

"-Enquanto isso - disse Abrenuncio -, toquem música, encham a casa de flores, façam cantar os passarinhos, levem-na para ver o pôr-do-sol no mar, deem-lhe tudo o que possa fazê-la feliz. - Despediu-se rodando o chapéu no ar e com a frase latina de rigor. Mas desta vez traduziu-a em homenagem ao marquês: - 'Não há remédio que cure o que a felicidade não cura'." (pág. 51)

"No mais, continuou vivendo como sempre vivera desde nascer: um solteiro inútil." (pág. 56)

"Já de saída, parou junto à rede do marquês e precisou o prognóstico:
-A senhora marquesa morrerá o mais tardar no dia 15 de setembro, se antes não se pendurar numa viga.
Sem se alterar o marquês disse:
-O ruim é que o dia 15 de setembro ainda está longe." (pág. 74)

"-Às vezes atribuímos ao demônio certas coisas que não entendemos, sem cuidar que podem ser coisas que não entendemos de Deus.
-Assim disse Santo Tomás, e é a ele que me atenho - disse a abadessa. - Não se deve acreditar no demônio, nem quando fala a verdade." (pág. 120)

"Antes de mais nada, queria saber, segundo disse, como era a menina antes de ser internada no convento.
-Não sei - disse o marquês. - Sinto qe a conheço menos quanto mais a conheço." (pág. 164/165)

"-Gostaria de saber por que é tão amável comigo - disse.
-Porque nós ateus não conseguimos viver sem os padres - disse Abrenuncio." (pág. 183)

domingo, 28 de dezembro de 2014

Meu pai fala cada m*rda

Título: Meu pai fala cada m*rda
Autor: Justin Halpern
Páginas: 142

Livro simplesmente hilário. O pai do autor sempre foi uma pessoa sem papas na língua, falava o que dava na telha, sem se preocupar com a plateia ou o ambiente. O livro mostra alguns momentos da relação pai e filho, onde o pai dá sempre alguns "conselhos" ao filho.

São sempre frases sarcásticas, procurando sempre a teoria de condensar o "ensinamento" em poucas palavras. Não sei se isso teve alguma influência na educação do autor, mas que a leitura das frases é um deleite, isso, sem dúvida. Para quem gosta de respostas irônicas, eis aqui um livro de leitura obrigatória.

Trechos interessantes:

"Sobre o primeiro dia no jardim de infância
'Você achou difícil? Se o jardim de infância foi difícil para você, tenho más notícias sobre o resto da sua vida'."

"Sobre falar com estranhos
'Escute aqui, se alguém está sendo gentil e você não sabe quem é essa pessoa, saia correndo. Ninguém é gentil sem mais nem menos e, se isso acontecer, a pessoa pode levar a porra da gentileza para outro lugar'." (pág. 17)

"Sobre comprar um cachorro
'Quem vai tomar conta? Você?... Filho, você entrou em casa ontem com cocô nas mãos. Cocô humano. Não sei como isso aconteceu, mas, se alguém tem cocô nas próprias mãos, isso é um indício de que talvez essa pessoa não esteja preparada para assumir responsabilidades'." (pág.30)

"Sobre não se sentir à vontade para fazer cocô no banheiro da escola
'Filho, você está reclamando com o homem errado. Consigo cagar em qualquer lugar, a qualquer hora. É uma das minhas maiores qualidades. Há quem diga que é a maior de todas'." (pág. 31)

"-Eu fui pobre. Sua mãe também. Faço um grande esforço para que você não tenha que passar por muitas das coisas que eu vivi.
-Então, por que essa não pode ser uma delas?- perguntei.
-Filho, você vai comer essa gororoba por uma semana. Sua mãe passou fome durante toda a infância. Quando você dá um piti como o desta noite, ela se sente péssima. É como se você estivesse dizendo que não se importa com o que ela passou. Isso faz sentido?" (pág. 46/47)

"Sobre comer acidentalmente biscoitos caninos
'Tenho comido biscoitos para cachorro? Por que diabos você os guarda no mesmo armário que a comida? Foda-se, são uma delícia. Não vou sentir vergonha por causa disso'." (pág. 56)

"Meu pai sempre valorizou educação e trabalho duro.
-Se você trabalha e estuda pra valer e se fode, tudo bem. Se você não se esforça e se fode, você é um merda - ele me disse em mais de uma ocasião." (pág. 57)

"Sobre mulheres
'Aquela mulher era sexy... Muita areia para o seu caminhãozinho? Filho, deixe que as mulheres descubram por que não querem transar com você. Não faça isso por elas'." (pág. 91)

"Preocupe-se em viver, morrer é a parte fácil." (pág. 97)

"-As pessoas estão sempre tentando dizer como se sentem. Algumas são diretas e outras falam por meio de suas ações. Você precisa prestar atenção. Não sei o que vai acontecer com sua namorada. Acho que ela deve ser uma boa pessoa e espero que você consiga o que quer. Mas faça-me um favor: ouça e não ignore o que ouvir." (pág. 139)

sábado, 27 de dezembro de 2014

Aléxandros - As areias de Amon

Título: Aléxandros - As areias de Amon
Autor: Valerio Massimo Manfredi
Páginas: 350

Este livro é a segunda parte da história de Alexandre. Nele são apresentadas as suas façanhas no campo de batalha. Estratégias de guerra, alianças, traições, espionagens, contra-ataques, enfim todas as artimanhas que permeiam as épicas batalhas.

Não deve ser fácil comandar um exército de cem mil homens, que passa anos e anos se deslocando por terras cada vez mais longínquas, com o objetivo de aumentar seu reino. Além das batalhas em si, ainda há o problema de alimentação para homens e animais, tratar dos feridos, montar e desmontar as máquinas de guerra em cada cidade que desejam conquistar. Em suma, é uma tarefa gigantesca. Somente lendo o livro para se ter uma ideia.

Trechos interessantes:

"-Tudo isso não tem a menor importância, bem sabes disso - replicou Calístenes. - Em Esparta, no templo dos Dióscuros, mostram o ovo do qual teriam nascido os dois gêmeos irmãos de Helena, mas eu pessoalmente acho mais provável que se trate de um ovo de avestruz, um pássaro líbico com a altura de um cavalo. Os nossos santuários estão cheios deste tipo de relíquias. O importante é o que as pessoas querem crer, e elas precisam crer, precisam sonhar." (pág. 12/13)

"-É neste trecho de mar, no mero espaço que podemos abarcar com o olhar, que se decidiu a sorte das guerras persas: aquela ilhota perto da cidade é Lade, e foi lá que a frota dos rebeldes foi aniquilada pelos persas.
-Agora Calístenes vai dar uma aula de história, como se já não nos bastassem aquelas do seu tio, em Mésia - comentou Heféstion.
-Calado! - silenciou-o Alexandre. - Se não conheces o passado, não podes entender o presente." (pág. 85)

"-Eu não preciso de descanso nenhum - disse - e ainda tenho condições para ensinar a qualquer um aqui dentro, exceto o rei - mas dava para entender claramente que queria dizer 'inclusive o rei' - como segurar uma espada. E se me for permitido decidir eu mesmo a este respeito, só há uma maneira de mandar-me de volta à pátria antes do cumprimento da campanha, qualquer que seja a sua meta final: reduzido a cinzas e dentro de uma urna funerária." (pág. 101)

"-Pego aquilo de que preciso onde consigo encontrá-lo, e de qualquer maneira é meu dever descobrir tudo o que há para se descobrir: eu mesmo decidirei o que ocultar, o que contar e como contá-lo. Esta é a grande vantagem dos historiadores." (pág. 146)

"-Parece que o seu humor mudou - observou Ptolomeu.
-Com efeito - admitiu Seleuco. - Talvez tenha lembrado o que sempre dizia Aristóteles: 'Ou há uma solução para o problema, e então não há com o que se preocupar, ou não há solução, e então tampouco há com o que se preocupar'." (pág. 221)

"Desfilaram no grande rio diante das pirâmides que brilhavam como diamantes sob o sol a pique e diante da gigantesca esfinge, ali deitada havia milênios para cuidar do sono dos grandes reis.
-Segundo Heródoto, trinta mil homens levaram trinta anos para erguê-la - explicou Aristóxeno.
-Achas que é verdade? - perguntou Alexandre.
-Creio que sim, embora neste país se contem mais histórias do que em qualquer outra parte do mundo, simplesmente porque aconteceram muitas coisas, com o passar dos séculos." (pág. 335)

"Alexandre ficara calado até aquele momento, continuava andando absorto, como se estivesse seguindo uma voz misteriosa. Todos olharam para ele, já cientes de que estavam sendo conduzidos por um ser sobre-humano que podia sobreviver a ferimentos que teriam matado qualquer outro, que podia fazer chover no deserto e talvez até fazer crescer flores nele, se assim quisesse." (pág. 345)

quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

O guardião de memórias

Título: O guardião de memórias
Autor: Kim Edwards
Páginas: 362

David é um médico renomado que venceu na vida por seus próprios méritos, mas constantemente atormentado pela morte da irmã, quando eram crianças. Norah, esposa de David, está grávida e o próprio David irá realizar o parto. Nasce Paul, uma criança saudável e depois uma menina com síndrome de Down. David pede à enfermeira para doar a menina a uma instituição (alegando que ela teria pouco tempo de vida e iria sobrecarregar a esposa) e diz a Norah que a menina havia morrido no parto.

Mas a enfermeira se recusa a entregar a criança à instituição e passa a criá-la como sua filha. Apesar de todas as dificuldades a menina vai se desenvolvendo enquanto David luta com a consciência sobre contar ou não o fato à mãe e Norah, desde o início se sente abalada com a notícia da morte da menina. Com o passar dos anos, por mais que David se esforce para apagar esse episódio de sua vida, sua família vai cada vez mais se desestruturando.

Trechos interessantes:

"Norah olhou para o rosto pequenino do filho, surpresa, como sempre, ao ouvir seu nome. O menino ainda não crescera o bastante para assimilá-lo, ainda o usava como uma pulseira que poderia soltar-se facilmente e desaparecer. Ela havia lido sobre pessoas - também não se lembrava onde - que se recusavam a dar nome aos filhos durante várias semanas por acharem que eles ainda não faziam parte da Terra, ainda estavam suspensos entre dois mundos." (pág. 43)

"-Você tem razão, Norah, tudo pode acontecer, a qualquer momento. Mas as coisas que correm mal não são culpa sua. Você não pode passar o resto da vida pisando em ovos, tentando evitar os desastres. Não funciona. Você só acabará perdendo a vida que tem." (pág. 76)

"-Meus pais tinham grandes sonhos para mim - disse. - Mas eles não combinavam com meus próprios sonhos." (pág. 108)

"Paul também havia adorado aquilo quando pequeno, não tanto pelo ritual da pesca,  mas pela chance de passar algum tempo com o pai. À medida que ficara mais velho, porém, as pescarias tinham passado a parecer cada vez mais obrigatórias, como uma coisa que seu pai planejava por não conseguir pensar em mais nada para fazer." (pág. 189)

"Quando eu tinha mais ou menos a sua idade, arranjei um emprego, para poder frequentar o colégio na cidade. E aí a June morreu, e eu fiz uma promessa a mim mesmo: ia sair e consertar o mundo - disse, e abanou a cabeça. - Bem, é claro que não foi o que fiz, na verdade. Mas nós estamos aqui, Paul. Temos tudo em abundância. Nunca nos preocupamos em saber se teremos o bastante para comer. Você irá para a faculdade que quiser. E, no entanto, só consegue pensar em se drogar com seus amigos e jogar tudo fora." (pág. 200)

"O que mais posso lhe dizer? Você se poupou muitas dores de cabeça, com certeza. Mas, David, também perdeu muitas alegrias." (pág. 225)

"David tinha tentado proteger o filho das coisas que sofrera quando criança: pobreza, preocupações, tristezas. Mas seus próprios esforços haviam criado perdas que ele nunca tinha previsto. A mentira crescera entre eles como uma rocha, obrigando-os a também crescerem de forma estranha, como árvores retorcidas em volta de um pedregulho." (pág. 233)

"Nas montanhas, e talvez no mundo em geral, havia uma teoria da compensação que dizia que, para tudo que era dado, outra coisa se perdia, de maneira imediata e visível. Bom, você herdou a cabeça, mesmo que sua prima tenha herdado a beleza. Elogios sedutores como flores, mas espinhosos com seus opostos: É, você pode ser esperto, mas é feio como o diabo; você pode ser bonito, mas não tem cérebro. Compensação, equilíbrio do universo." (pág. 237)

"A família de David tinha sido muito pobre; todos os seus conhecidos eram pobres. Não era crime, mas bem que poderia ser. Era por isso que se guardavam coisas, motores velhos, latas de conserva e garrafas de leite, espalhados pelos gramados e pelas encostas: uma defesa contra a necessidade, uma precaução contra a carência." (pág. 238/239)

"Preocupara-se com a responsabilidade que teria de assumir, com o modo como sua vida se modificaria com o fardo de uma irmã retardada, e ficara surpreso - atônito, na verdade - ao ouvir essa própria irmã dizer Não, eu gosto da minha vida como está, não, obrigada." (pág. 356)

terça-feira, 23 de dezembro de 2014

A jogadora de xadrez

Título: A jogadora de xadrez
Autor: Bertina Henrichs
Páginas: 160

Eleni é casada, mãe de dois filhos e trabalha de camareira num hotel de uma pequena ilha grega. Ao arrumar o quarto de um casal francês, depara com um jogo de xadrez (que não conhecia) e fica impressionada, tentando descobrir como funciona. Compra um jogo para dar de presente ao marido, que não dá a mínima, e ela passa então a aprender o jogo, com a ajuda de um professor da cidade.

O que achei realmente de interessante no livro é o fato de usar uma mulher como personagem principal, já que, em geral, as mulheres não são muito adeptas do xadrez. Há exceções, claro, mas a grande maioria de aficcionados por xadrez é homem. Livro pequeno, história interessante e agradável de se ler.

Trechos interessantes:

"Atingira aquele ponto da vida que, na falta de algo melhor ou para efeito de encorajamento, costuma se chamar de a força da idade; a idade espremida entre a dos pais que envelhecem e a dos filhos adolescentes; idade vaga, em que os homens já não torcem o pescoço à sua passagem e em que as outras mulheres já não invejam nada em você." (pág. 10)

"Mesmo que tivesse mais facilidade para falar, jamais conseguiria convencer Katherina, que não conseguia ver nada além da aparência das coisas: um tabuleiro com 64 casas, peças brancas e pretas, e duas pessoas caladas a movê-las com a maior seriedade depois de uma reflexão que poderia levar horas." (pág. 65)

"'O que você quer...', comentavam as pessoas ao vê-lo passar perdido em seus pensamentos, 'ele também envelhece. Está se desligando do mundo exterior. É da natureza das coisas'." (pág. 77)

"No caso dele, a leitura chegara a ocupar um lugar jamais outorgado a nenhum ser humano. Por que perder tempo em inúteis conversações cotidianas quando podemos estar sempre em contato com os melhores e os mais instigantes pensadores de todos os tempos? Por que permitir que a vida seja ocupada por seres medíocres - atraentes, é verdade, mas de raciocínio fraco -, quando temos a possibilidade de visitar Platão, Sêneca e Proust?" (pág. 78)

"Numa de suas noites de combate, deu-se conta, subitamente, de que todos os grandes teóricos eram homens. Nunca ouvira falar de alguma grande jogadora de xadrez. O talento para o tabuleiro parecia residir em algum lugar dentro dos testículos." (pág.94)

sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

A linguagem das flores

Título: A linguagem das flores
Autor: Vanessa Diffenbaugh
Páginas: 294

Victória é uma jovem que cresceu passando de um orfanato para outro. Isso a tornava cada vez mais revoltada e indiferente a tudo. Ao completar os 18 anos ela tem que sair do orfanato e cuidar de sua própria vida. O que acontecerá já que ela tem um desprezo total por todas as pessoas e pela vida de maneira geral?

O livro apresenta uma grande lição de vida, baseada numa frase simples: você tem que querer. Se a mudança partir de você, muitas coisas podem de fato acontecer. Além da história de vida de Victoria outro ponto agradável no livro é a informação do significado de vários tipos de flores. Curioso, mas interessante.

Trechos interessantes:

"-Acredito que você também pode provar que todos estão errados, Victoria. Seu comportamento é uma escolha, não quem você é de verdade." (pág. 45)

"Lembrei-me das palavras que Meredith me dissera na Gathering House e outras centenas de vezes antes: Você tem que querer. Você tem que querer ser uma filha, uma irmã, uma amiga, uma estudante, repetira ela à exaustão. Eu nunca quisera nenhuma dessas coisas e as promessas, ameaças ou subornos de Meredith nunca haviam mudado minha convicção. Mas, de repente, eu soube que queria ser florista. Queria passar minha vida escolhendo flores para desconhecidos, meus dias oscilando entre o frio da câmara frigorífica e o barulho da gaveta da registradora." (pág. 55)

"Ela colocava uvas em sua boca e depois na minha, falando números que correspondiam ao grau de maturação: 74/6, 73/7 e 75/6. Isto, dizia quando localizávamos um cacho maduro, é o que você precisa ter em mente. Este exato sabor - açúcar 75 e tanino 7. Essa é uma uva perfeitamente madura, algo que nem uma máquina nem um amador conseguem identificar." (pág. 117/118)

"Eu começaria a chorar antes de terminar de falar, mas mesmo assim ela entenderia. E iria querer. O brilho em seus olhos seria a prova de sua devoção ao nosso filho, enquanto minhas lágrimas seriam a prova da minha incapacidade de ser mãe. A certeza de que eu iria decepcioná-lo (e a incerteza de como ou quando isso iria acontecer) me impediria de compartilhar do seu entusiasmo, me manteria isolada de suas declarações de amor." (pág. 172/173)

"O mundo seguia seu ritmo frenético, indiferente à bebê que chorava a seis quarteirões dali, à bebê que eu tinha dado à luz mas cujos gritos já não ouvia mais. O bairro continuava existindo como na semana anterior e na quinzena antes dela, como se absolutamente nada tivesse mudado. O fato de minha vida ter virado de cabeça para baixo não importava a ninguém e, ali fora, naquela calçada, longe da fonte do tumulto, meu pânico pareceu injustificável."(pág. 218)

"Queria recomeçar minha vida, tomar um rumo que não me levasse àquele momento, a acordar sozinha em um parque municipal, com minha filha largada num apartamento vazio. Cada decisão que eu havia tomado me conduzira até ali e eu queria mudar tudo: o ódio, a culpa e a violência. Queria almoçar com a menina revoltada que tinha sido aos 10 anos para alertá-la sobre essa manhã e dar-lhe as flores que a conduziriam por um caminho diferente." (pág. 230)

"Se fosse verdade que o musgo não tinha raízes e que o amor materno poderia crescer espontaneamente, vindo do nada, talvez eu tivesse me enganado ao me julgar incapaz de criar minha filha. Talvez os indiferentes, os rejeitados, os mal-amados pudessem aprender a dar amor com tanta abundância quanto qualquer outra pessoa." (pág. 282)

terça-feira, 16 de dezembro de 2014

Histórias de futebol

Título: Histórias de Futebol
Autor: Luiz Vilela / Fernando Bonassi / Bruno Zeni / Marcelino Freire / João Antônio / Henrique Félix / JoaÃnzanello Carrascoza / Edy Lima / Antônio de Alcântara Machado
Páginas: 96

Livro escolar, da coleção 'O prazer da prosa', para uma leitura rápida enquanto aguardava na sala de espera.

É um livro de contos onde a temática, como o próprio título diz, é o futebol. Aqui há histórias dos mais variados tipos e gostos. Com certeza alguma irá lhe agradar. Livro pequeno, de leitura fácil, mas nem por isso, menos interessante.

Trechos interessantes:

"Meu Deus! Gritou ele. Meu filho vai ser bicha. Credo! Ficou a noite todinha olhando a alma pregada no teto. Não pode ser. Rezou. Chorou. O menino é menina. Ah! Isso não vai ficar assim. Vou treinar o condenado. Vou salvar o moleque." (pág. 38/39)

"Eu estava ali, em grupo, mas por dentro estava era sozinho, me isolava de tudo. Era um sentimento novo que me pegava, me embalava. Eu nunca disse a ninguém, que não me parecia coisa máscula, dura de homem." (pág. 46)

"Já pelo nosso lado, eu era tão-somente um médio-volante mediano, pra não dizer esforçado; Aquiles era apenas um lateral-direito esforçado, pra não dizer grosso; e Lula, por fim, era um jogador grosso, sem posição, pra não dizer uma nulidade. A bem da verdade, nós três estávamos mais para cê-dê-efes do que para cê-dê-bês, isto é, craques de bola." (pág. 61)

"É preciso saber perder, filho, há chutes indefensáveis, a bola às vezes sabe quando será da rede e não do goleiro." (pág. 74)

"-A senhora já viveu muito, não é tia?
-Isso não vem ao caso, afinal, como digo sempre, 'quando acordo de manhã, já estou com o dia ganho'." (pág. 80)

domingo, 14 de dezembro de 2014

Nas arquibancadas

Título: Nas arquibancadas
Autor: John Grisham
Páginas: 186

A cidade de Messina está recebendo a visita de grandes astros do futebol americano. Mas não se trata de nenhum jogo ou apresentação. O treinador Rake, o mais notável e aclamado treinador de Messina, está à beira da morte e todos querem prestar suas homenagens.

Durante a vigília os astros se sentam nas arquibancadas e relembram os momentos que ficaram marcados para sempre, incluindo o treinador Rake, amado e odiado por todos. Os jogadores aproveitam também para rever suas vidas e atitudes pessoais e a maneira como o treinador teve importância para influenciar e modificar essas atitudes.

Trechos interessantes:

"Por causa da maratona, todos se apresentavam em ótima forma. Não era raro jogadores pesados perderem dez ou quinze quilos durante o verão, não pela namorada nem para melhorar seu físico. O peso era perdido para sobreviver à maratona dos Spartans." (pág. 34)

"Não havia nenhuma condição preexistente, nenhum problema físico. Um garoto de quinze anos perfeitamente saudável sai de casa às sete e meia de certa manhã de domingo para uma sessão de duas horas de tortura e não volta para casa. Pela primeira vez na história desta cidade, o povo perguntou: 'Por que exatamente você faz os garotos correrem numa sauna até começarem a vomitar?'" (pág. 66)

"-Qual foi a reação dele?
-Rake disse que não sabia muita coisa sobre os gays, mas se eu sabia quem eu era, então que todo mundo fosse à merda. 'Vá viver sua vida, filho', ele disse. 'Alguns vão odiar você, outros vão te amar, a maioria não resolveu ainda. Depende de você'." (pág. 79)

"'Volte dentro de alguns anos, grandalhão, e eles nem reconhecerão seu nome', Neely pensou. 'Sua carreira fabulosa será uma nota de rodapé. Todas as meninas interessantes serão mães. A jaqueta verde será uma fonte de grande orgulho pessoal, mas você não poderá usá-la. Coisa de colégio. Coisa de criança.'
Por que era tão importante no passado?" (pág. 85)

"-Eu não tinha ideia do quanto é doloroso um coração partido até minha mulher ir embora. Foi um pesadelo. Pela primeira vez compreendi o que você tinha sofrido. Compreendi o quanto eu fui cruel." (pág. 157)

quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Vá de bike

Título: Vá de bike
Autor: Grant Petersen
Páginas: 230

O livro foi escrito como um manual para os apaixonados por ciclismo, com tópicos relacionados a segurança, equipamentos, orientações, etc. Mas eu achei mais parecido com um relato pessoal e suas preferências sobre isto ou aquilo.

Para quem gosta de ciclismo de fato, não acho que o livro seja de muita ajuda. E se a ideia for atrair novos adeptos aí que o livro falha mesmo: não há nada que possa ser realmente atrativo para o novo ciclista. Enfim, alguns tópicos relevantes, mas não chega a fazer a diferença.

Trechos interessantes:

"Existem pelo menos dois tipos de segurança: ativa e passiva. A segurança passiva é sua capacidade de sobreviver a um acidente; e a segurança ativa é sua capacidade de evitar um." (pág. 39)

"Você está mais seguro quando está usando um capacete e superestimando a proteção deste ou quando está sem capacete e pedalando com mais cuidado? Talvez a resposta seja usar o capacete e esquecer que está com ele, mas é mais fácil falar do que fazer. A maioria das pessoas sabe muito bem quando está com algo na cabeça." (pág. 52)

"Uma bicicleta na chuva, sem para-lama, é como um carro na chuva com a janela aberta." (pág. 111)

"Afirmarei o óbvio: os profissionais a usam [bicicleta de corrida] porque são pagos para isso. Ser pago para usá-la é a única boa razão que consigo pensar para andar nesse tipo de bicicleta." (pág. 189)

"Sou totalmente a favor das instituições beneficentes, mas pedir a pessoas comuns, ou mesmo a empresas, que deem dinheiro para você poder andar de bicicleta, como se você estivesse 'arrecadando fundos',é um pouco demais." (pág. 198)

"Todo mundo que convive com ciclistas conhece casais que dão certo pedalando juntos, mas eles dariam certo pedalando juntos ou não, portanto, não pense que andar de bicicleta faz bem a um relacionamento. Há muitas coisas que podem dar errado se você tentar convencer uma parceira, ou parceiro, relutante a participar de sua paixão." (pág. 204)

segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Eu sou o mensageiro

Título: Eu sou o mensageiro
Autor: Markus Zusak
Páginas:

Ed é um garoto de 19 anos, sem nenhuma perspectiva na vida, sem nenhum talento especial, ou seja, uma pessoa perfeitamente comum. De repente aparece em sua caixa de correio uma carta de baralho com 3 endereços e ele pressupõe que sejam pessoas que precisam de sua ajuda. Depois de resolver estes casos, mais cartas continuam aparecendo e ele se considera um mensageiro com uma tarefa a cumprir.

A história acaba conquistando o leitor, que fica sempre curioso sobre o conteúdo das próximas cartas que virão e a forma como Ed vai se desembaraçar da tarefa. Como curiosidade, os capítulos do livro são numerados na sequência das cartas do baralho. No resumo, é uma boa leitura e quem já leu e gostou de 'A menina que roubava livros' não vai se decepcionar.

Trechos interessantes:

"Eu estou sempre me perguntando: 'E aí, Ed, o que você fez de útil nesses 19 anos de vida?' A resposta é simples.
Porra nenhuma." (pág. 20)

"'Tu é um homem morto,' ouço aquela voz de novo, e vejo as palavras na minha cara quando entro no táxi e olho no espelho retrovisor.
Isso me faz pensar sobre minha vida, minhas realizações inexistentes e minhas habilidades gerais de incompetência.
Quando estou tirando o carro do estacionamento, penso: Um homem morto. Ele tem razão." (pág. 39)

"-Você é meu melhor amigo, Ed.
-Eu sei.
Essas palavras podem matar um homem.
Não precisa nem de arma.
Nem de balas.
Só das palavras e de uma garota." (pág. 109)

"Padre O'Reilly volta pra mesa agora, reprovando com a cabeça.
-Esses são os Parkinsons. Cambada de inúteis.
Fico chocado com o comentário. Nunca ouvi um padre falar assim. Na verdade, nunca falei com nenhum padre, mas duvido muito que seja assim.
-Isso acontece sempre? - pergunto.
-Duas vezes por semana. Pelo menos.
-Como o senhor consegue aguentar uma coisa dessas?
Ele simplesmente estica os braços e bate na batina.
-É para isso que estou aqui." (pág. 129)

"-O que é, padre?
-Sabe, dizem que há inúmeros santos que não têm nada a ver com a Igreja e praticamente não têm nenhum conhecimento de Deus. Mas dizem que Deus anda com essas pessoas sem que elas se deem conta disso - os olhos dele estão dentro de mim agora, acompanhados pelas palavras. - Você é uma dessas pessoas, Ed. É uma honra conhecê-lo." (pág. 140)

"Tem sangue nas minhas mãos e no final da rua. Por um instante, fico torcendo para que entendam o que estão fazendo e o que estão enfrentando.
Tenho vontade de dizer pra eles, mas percebo que só estou aqui como mensageiro. Não estou aqui pra decifrar nem mostrar o sentido da mensagem. Isso eles têm que fazer sozinhos." (pág. 157)

"Não é nada demais, coisa pequena, mas acho que é verdade o que se diz por aí, tipo que as grandes coisas são sempre coisas pequenas que percebemos." (pág. 195)

"Às vezes as pessoas são bonitas.
Não pela aparência física.
Nem pelo que dizem.
Só pelo que são." (pág. 199)

"Ela conclui:
-Você tá melhor.
É com estas palavras que vejo as coisas do ponto de vista da Audrey. Ela gostava quando eu era simplesmente Ed. Era mais seguro assim. Estável. Agora, ando mudando as coisas. Deixei minhas digitais no mundo, mesmo que pequenas, e isso mexeu no equilíbrio entre nós dois. Talvez ela tenha medo de eu não querê-la, já que não posso tê-la." (pág. 207)

"-Eu só quero que você seja alguém na vida - aos poucos, bem devagar, ela se aproxima das escadas da frente. -Você tem que entender uma coisa, Ed.
-O quê?
Com cuidado, ela diz:
-Acredite ou não, é preciso muito amor pra te odiar desta forma." (pág. 219)

sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

Histórias que não me deixaram fazer na TV

Título: Histórias que não me deixaram fazer na TV
Autor: Alfred Hitchcock
Páginas: 196

Não sei se é porque já li uma porção de coletâneas desse tipo e tudo começa a parecer repetitivo, mas o fato é que de todas as treze histórias, pouquíssimas me chamaram a atenção.

Minha escolha fica entre as histórias "A casa do homicídio" e "Daqui a dez minutos". As duas são boas. Quanto às demais, cumprem o papel e dão volume ao livro, mas não se destacam tanto quanto as citadas.

Trechos interessantes:

"-Somente um epicurista, um verdadeiro gourmet como Jerome Steeks, ficaria chocado ao me ver pondo gelo num Chambertin. Somente um homem que conhece a fundo como comer e beber aprecia vinhos o bastante para compreender que o buquê do Chambertin seria destruído, congelado pelo frio. Steeks sabe que vinho tinto deve ser sempre bebido na temperatura da sala." (pág. 44)

"-Já devia saber que ninguém mais escreve cartas atualmente, mamãe. Não vai demorar muito para que deixem de ensinar a escrever na escola e tudo passe a ser feito pelo telefone ou por computador." (pág. 56)

"Ali estava um médico, que prestara o juramento de Hipócrates para preservar a vida, acenando com os braços como um diretor de TV, para mostrar ao cara na cadeira a melhor maneira de morrer.
Prenda a respiração, depois respire fundo: não vai sentir nada. Claro que o ácido cianídrico vai derreter as suas entranhas, transformá-las numa massa quente, vai queimar todas as fibras nos seus pulmões, enquanto se sacode freneticamente. Mas não estará realmente sentindo coisa alguma. O corpo estará se sacudindo apenas como uma reação dos terminais nervosos." (pág. 78)

"O rosto rechonchudo de Sarah, inchado de vinho e de raiva, os cabelos pintados caindo desordenadamente, o corpo protuberante onde não deveria e carecendo de curvas nos lugares necessários, a última de suas ilusões desaparecidas, ela era a caricatura grotesca de todas as mulheres do mundo enganadas e envelhecidas." (pág. 103)

"Ser casado com Squeakie é um trabalho de tempo integral. O nome dela é na verdade Desdemona, mas faço todo o possível para esquecê-lo. O pai era um cavalheiro da velha guarda, que gostava de citar Shakespeare a todo instante. Squeakie saiu a ele. Não que isso torne as coisas tão difíceis assim. Um pouco de Shakespeare de vez em quando é maravilhoso. Mas é que às vezes eu me sinto como o camarada que estava montado no tigre: simplesmente não podia desmontar." (pág. 135)

domingo, 30 de novembro de 2014

Contato visual

Título: Contato visual
Autor: Cammie McGovern
Páginas: 304

Uma criança é morta num parque da escola e todos estão à cata do assassino. O problema é que a única pessoa que pode auxiliar na busca é um aluno autista. Como fazê-lo perceber a importância do que estão procurando e como extrair essa informação? Esse é o ponto.

A autora consegue elaborar uma boa trama onde o ponto principal é trazer à tona a discussão sobre os autistas. Embora muita gente diga que não, cada pessoa é especial. Resta descobrir a maneira de aproveitar o que todos têm de bom, mas que alguns não conseguem demonstrar. Grande tema, ótima leitura, bom livro.

Trechos interessantes:

"Aos quatro anos, ele era capaz de identificar um clarinete, um oboé, um fagote, mas não conseguia, nem sob pressão, apontar para uma calça. Essa é a peculiaridade de um cérebro autista, a maneira como alguns caminhos funcionam, e outros não." (pág. 19/20)

"Ela só consegue pensar: é estranho que alguém que não o conhece, que só viu Adam eu seu pior momento, com a aparência mais autista que ele teve em anos, pode ter mais esperança de um avanço que ela." (pág. 36)

"De uma coisa Cara tem certeza: quando seu filho é autista, a família toda quer poder fazer algo por você." (pág. 99)

"Muitas crianças são testemunhas ruins. Isso acontece sempre, uma criança fica a dez metros de um assassinato, e você quer saber o que ela geralmente diz? A cor da calça do assassino? Elas ficam com medo demais para olhar para cima. Rostos dão medo. Na maioria das vezes, uma criança que presenciou um assassinato não sabe dizer que arma foi usada. Elas não veem esse tipo de coisa. O cérebro delas não processa isso." (pág. 109)

"Em algumas situações da vida só uma coisa importa. Ou você preenche os requisitos ou não." (pág. 146)

"Amizade significa que você ajuda a outra pessoa. Fica ao lado dela." (pág. 211)

"'Escute', a mulher finalmente disse, 'você pode fazer como quiser. Não vou dizer a você como viver sua vida porque nem nos conhecemos. Mas todos os livros que você ler, todos os estudos, vão dizer que uma criança que sabe quem é seu pai é mais equilibrada, mais saudável. Um nome na certidão de nascimento é muito melhor que nada'." (pág. 236)

terça-feira, 25 de novembro de 2014

O amor pode ter asas

Título: O amor pode ter asas
Autor: Bianca Rocha
Páginas: 432

Mais um livro típico para adolescentes. A história, o enfoque, os personagens, a maneira de contar e tudo mais demonstra que o público alvo é o adolescente. Também, pelo que li na contracapa, a autora tem apenas 16 anos, portanto é natural que seja esse o direcionamento.

A história retrata o amor de dois jovens: Jasmim e Daniel. Até aí nada de mais a não ser o fato de que Jasmim é uma... fada, com asas e tudo mais. E Daniel, é claro, não sabe disso. Mas o que mais me chamou a atenção não foi a história em si, mas um número elevado de erros na impressão. Tina no lugar de tinha (pág. 305), afundo ao invés de a fundo (pág. 338), concertar ao invés de consertar (pág. 65) e inúmeras outras. Não sei se por tratar de primeira edição, mas acho que o revisor estava cochilando quando foi impresso.

Trechos interessantes:

"Em horas que você não sabe o que fazer, não há nada melhor do que ter uma mãe do lado para te dar apoio. As mães, por incrível que pareça, sempre têm uma resposta para nossas perguntas." (pág. 19)

"-O que é mais chato para você?- perguntei, esquecendo-me completamente de que estávamos sendo observados.
-Ah, o fato de que, se você der um passo, todo mundo fica sabendo. Eu tenho dó das pessoas famosas, como cantores e atores, que frequentemente veem em jornais e revistas notícias do tipo: 'Artista tal foi visto na praia tomando banho de Sol. Ele tomou uma água de coco e duas Cocas de 200 ml'. Deve ser insuportável." (pág. 67)

"O futuro não passa de uma caixa fechada. Você não pode abri-la, porque ela se abre sozinha. E quando isso acontece, o mundo muda. Para melhor ou para pior, mas ele muda. E você não pode fazer nada a não ser aceitar." (pág. 89)

"-Ser diferente é a coisa mais normal do mundo. Não é o que você consegue fazer que vai dizer quem você é." (pág. 133)

"[...] perdoar é divino. E se você percebe que seu maior inimigo está caindo, não é certo cantar vitória e esfregar a derrota na cara dele. Para que colocar mais lenha na fogueira? Por que você não simplesmente o ajuda a aceitar a derrota e a encarar outras batalhas? E se você pensar comigo, vai perceber que, se seu inimigo desistir de travar batalhas com você, você também não poderá batalhar." (pág. 156)

"-Tenho medo de descer do salto e descobrir que eu não sou perfeita.
-Mais cedo ou mais tarde isso vai ter de acontecer - eu disse. - E você vai ver que ser perfeita não é tão legal assim. Ser normal é bem melhor." (pág. 285)

"-O que você sente não é amor. É paixão. A diferença é que no amor sincero e real você só busca a felicidade da outra pessoa, esteja ela com você ou não. Eu cresci ouvindo isso. Só se ama uma pessoa se o que você deseja não for tê-la, e sim vê-la feliz. 'Se você ama alguém, deixe ir! Se voltar, é seu, se não voltar, nunca foi seu'." (pág. 305)

"-Um homem só pode ter certeza que está acordado se já tiver tido um sonho." (pág. 429)

sexta-feira, 21 de novembro de 2014

Private

Título: Private
Autor: James Patterson
Páginas: 208

Mais um romance policial e, mesmo sendo um livro do renomado autor James Patterson, não conseguiu me fazer entrar no clima. É assim mesmo: alguns livros conseguem prender o leitor e outros, nem tanto. Tem lá suas vantagens, mas eu esperava mais.

O livro conta a história de uma agência de detetives (a tal Private) com uma super equipe de investigadores e que possui uma grande reputação entre a alta sociedade. De repente, estão três casos a serem resolvidos simultaneamente e, mesmo assim, não consegui perceber a conexão entre eles que justificasse toda a propaganda do livro.

Trechos interessantes:

"Não existe dinheiro bom e dinheiro ruim. É tudo igual. Não passa de um instrumento de troca." (pág. 11)

"Esses assassinatos são todos diferentes. É uma loucura. Nunca vi nada assim antes. - Ela fez uma pausa aturdida. - Atirar em alguém demonstra distanciamento. Atear fogo é um crime sexual. Estrangular é pessoal. Temos esses três métodos e alguns outros. Esse mistério não se desenrola e ainda não consigo imaginar o assassino. Ele não se encaixa em nenhum perfil que eu conheça." (pág. 32/33)

"Apostadores jogam pela adrenalina. Passam da compulsão à dependência. Ganham e apostam novamente. Perdem, o que é mais provável, e a euforia se transforma em desânimo. Então apostam novamente para tentar recuperar o prejuízo. Não importa o que aconteça, continuam apostando." (pág. 62)

"-Você nunca tem dor de cabeça? Essa auréola apertando suas orelhas o tempo todo..." (pág. 113)

"-Não existe um jeito fácil de fazer isso. Podemos escolher entre o difícil e o mais difícil." (pág. 162)

"O fato é que Los Angeles é um lugar mais seguro por causa da dedicação de vocês. Obrigado.
Aquele agradecimento dava uma sensação boa. Qualquer que seja a substância química liberada pelo cérebro em decorrência desse momento, ela fazia meu corpo inteiro se sentir satisfeito. Dinheiro nenhum pagava a sensação inebriante de levar o lixo para fora e vê-lo ir embora, sabendo que não voltará." (pág. 193)

quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Montanha-russa

Título: Montanha-russa
Autor: Martha Medeiros
Páginas: 216

As crônicas sempre me fascinaram. Essa coisa de histórias curtas, onde o autor tem que entreter o leitor, usando apenas uma ou duas páginas, e geralmente de assuntos banais, consegue me cativar a fundo. São os livros que, teoricamente, podem ser lidos rapidamente, e são os que demoro mais tempo, querendo saborear cada frase, cada parágrafo.

Nunca havia lido nenhum livro de Martha Medeiros mas, depois deste, já fiz a minha lista de exemplares desta autora. Pena que, como tenho o hábito de manter a minha lista de leituras, ainda há de demorar um tempo até chegar aos mesmos.

Trechos interessantes:

"Nosso corpo é a casa da verdade, lá de dentro vêm todas as informações que passarão por uma triagem particular: algumas verdades a gente deixa sair, outras a gente aprisiona. Mas a verdade é só uma: ninguém tem dúvida sobre si mesmo." (pág. 17)

"Poucas pessoas chegam numa etapa da vida com tantos serviços prestados como ele ( - falando de Caetano Veloso - ). Poucos podem abrir mão de submeter-se aos índices de audiência, ao gosto padrão, às exigências de mercado, à opinião pública. São meia dúzia de seres acima do bem e do mal, que já deram seu recado e podem fazer unicamente o que estão a fim, na hora e da maneira que bem entenderem. Quem não celebra isso?" (pág. 20)

"A gente vive numa sociedade que não quer saciar nada, quer justamente o contrário: criar mais e mais necessidades estapafúrdias para que o sujeito nunca fique contente com o que tem e parta para aventuras quanto mais insanas, melhor. [...] São os viciados em novidade." (pág. 29)

"Livro nos dá conhecimento, uma visão mais aberta da vida e nos ensina a escrever melhor. Não nos torna chatos nem nos salva de sê-los. Chato é quem não nos faz rir." (pág. 37)

"Não existe nada mais triste, mais sem graça que a coisa realizada." (pág. 49)

"O que me trouxe para este assunto é que ficou claro para mim que a arte é sempre superior ao artista, e que a angústia deste é igualar-se à imagem que projeta, um desafio desumano e inalcançável. A arte é soberana, o artista é um reles mortal. A arte emociona, o artista resmunga. A arte é única, e o artista tem os mesmos defeitos que a gente." (pág. 77)

"Um dia desses uma leitora me escreveu um e-mail simpático, dizendo que havia lido ou escutado em algum lugar uma coisa que ela achava que fazia sentido: 'O tempo não cura tudo. Aliás, o tempo não cura nada, o tempo apenas tira o incurável do centro das atenções'." (pág. 108)

"Quando nossos olhos ficam embaçados, nada como usar os olhos dos outros para voltar a valorizar o que é nosso." (pág. 144)

"Já fiz citações demais por hoje, mas não há como esquecer a frase de Katherine Mansfield: 'A vida não pode ser apenas um hábito'." (pág. 163)

domingo, 19 de outubro de 2014

O falcão maltês

Título: O falcão maltês
Autor: Dashiell Hammett
Páginas: 190

Trata-se de um clássico do policial de investigação, mas, mesmo com toda essa pompa, o livro não prende a atenção, tornando a leitura muito cansativa.

Um detetive que se acha o máximo, uma estatueta que não se mostra, um bando de policiais desinteressados e uma cliente que é tudo, menos inocente, formam o esqueleto do livro. Tudo bem, clássico é clássico, mas não me empolgou como eu imaginava.

Trechos interessantes:

"-Ou você conta agora, ou vai contar no tribunal - disse Dundy com violência. - Não se esqueça que isto é um assassinato.
-Talvez. E aqui está uma coisa que você não deve esquecer,meu amor. Contarei ou não, como me agradar. Já vai longe o tempo em que eu chorava porque os polícias não gostavam de mim." (pág. 19)

"Ficou bastante assustado, disse-me, mas mais chocado que realmente amedrontado. Sentia-se como se alguém tivesse tirado a tampa da vida, e o deixasse ver o seu funcionamento." (pág. 57)

"-Vamos a algum lugar onde possamos conversar - propôs Spade.
Cairo levantou o queixo. -Queira desculpar-me. Nossas conversações em particular não tem sido de tal ordem que eu esteja ansioso por continuá-las. Perdoe a minha grosseria, mas é a verdade." (pág. 84)

"-Começamos bem, senhor - ronronou o homem gordo, virando-se com um copo de bebida na mão. -Desconfio do homem que diz chega. Se precisa ter cautela para não beber demais, é porque não se pode confiar nele, quando bebe." (pág. 92)

"Quanto mais reles o escroque, mais pomposa a arenga." (pág. 104)

"-Quis apenas dizer que você podia ter sido envolvido nisso sem se saber do que se tratava. Isso podia...
-Estou vendo - zombou Spade. - O senhor não acha que sou mau. Acha apenas que sou burro." (pág. 128)

"Bem, as melhores despedidas são as mais curtas." (pág. 179)

quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Sacramento

Título: Sacramento
Autor: Felipe Cangussu
Páginas: 400

A história é, no mínimo, surreal. Pela sinopse e pelas páginas iniciais não se nota mas, ao se aprofundar na leitura, as coisa começam a sair dos trilhos: pessoas que morrem e voltam à vida; habilidade para ler pensamentos; vingadores da morte e por aí vai.

Essa é a história de três amigos, com características diferentes, que se reencontram após o suicídio e retorno de um deles. Eles passam o livro todo fugindo da morte que está cobrando vingança pois o suicidado retornou. Confuso? É verdade, mas a história é assim mesmo. Se você gosta de 'A volta dos mortos vivos' vai se interessar pela história. Não é o meu caso.

Trechos interessantes:

"Eu quero viver! Suicídio é uma coisa muito complicada. Você tenta, tenta e, quando finalmente dá certo você morre. - Ninguém riu da piada" (pág. 70)

"Em casa, Maria reza. Na estrada, Mercedes benze." (pág. 88)

"Johnny não conseguia acreditar que dera de cara com aqueles mesmos policiais.
O planeta Terra é redondo, e, quando estamos em uma roda que gira, acabamos nos reencontrando com lugares ou pessoas que nunca imaginávamos rever." (pág. 177)

"-Meu avô sempre dizia: 'O que é pouco não se economiza, logo se acaba e a gente tranquiliza'. O ditado é mais ou menos assim." (pág. 182)

"Sabia que aquele jovem de cabelo liso estava passando por algum apuro interior. Alguma crise. Com seu olhar de curiosidade, era como se ele dissesse para Deus: 'Eu estou aqui! Fiz minha parte, e aí? Quando você vai começar a fazer a sua?'.
Deus sempre era a única saída de pessoas que fizeram de tudo na vida e estavam a ponto de acabar com ela." (pág. 210)

"Agora é só ir reto e, no final, virar à esquerda. Só isso. Ele tinha medo. Essa sensação de 'quase' sempre o fazia ficar temeroso. Por poucos centímetros, nadadores profissionais perderam campeonatos. Por poucos segundos, pessoas perdiam voos importantes. Por pouco, muitas pessoas quase sobreviviam a acidentes. 'Quase' pode não significar nada. Preciso ficar atento!" (pág. 263)

"Anderson já tinha reparado como as mulheres conseguiam ser sensuais sem nem mesmo perceberem. Isso é uma covardia. Não é porque elas não têm malícia que nós também não temos. A última coisa de que três homens à beira da morte precisam é de uma mulher seminua diante deles." (pág. 307)

"O perdão não é ficar calado e aguentar o rancor. O perdão é você escolher entregar o julgamento nas mãos de Deus e, até lá, deixar que Ele carregue o rancor. Enquanto a justiça não for feita, aja como se ela já tivesse acontecido. Olhe para o seu inimigo como se o crime já estivesse pago. O tempo é algo que limita o ser humano, mas, para Deus, o futuro já está consumado. Nós só precisamos ter paciência." (pág. 312/313)

quinta-feira, 2 de outubro de 2014

A história do alfabeto

Título: A história do alfabeto
Autor: John Man
Páginas: 264

Para nós, hoje, que já estamos fartamente habituados, o alfabeto é uma coisa simples e sem segredo. Mas já pensaram como isso tudo teve início? Quando não havia nada e alguém, pela primeira vez, teve a ideia de que tudo o que acontecia poderia ser preservado para a posteridade?!

Essa é a proposta do livro. Mostrar como uma coisa banal nos dias de hoje - o alfabeto - teve o seu início e a evolução desde então. Numa linguagem agradável e simples o autor mostra que, para se reduzir a 26 caracteres e com isso poder representar tudo o que existe no universo, muita coisa aconteceu.

Trechos interessantes:

"[...]os gregos não teriam exercido tanta influência se não fosse pela invenção que fixou os seus escritos, cujo nome partiu de seus dois primeiros sinais, alfa e beta - ou seja, o alfabeto." (pág. 16)

"A transmissão de informação ao longo deste milênio levou décadas. Com o crescimento da indústria no século XIX, décadas reduziram-se a anos e, posteriormente, com as viagens aéreas, a semanas. Agora que a evolução cultural tornou-se eletrônica, a informação flui para o mundo inteiro em segundos, e o analfabetismo passou a ser sinônimo de atraso." (pág. 19-20)

"Claro que é difícil! Tudo que vale a pena requer esforço! É assim que as coisas acontecem na vida se você quer ter uma boa formação e ser bem-sucedido." (pág. 47)

"Um cético poderia concluir que o deus dos cristãos e dos judeus foi inventado porque surgira uma tecnologia para definir essa crença e implantá-la na sua cultura. Já um crente diria que deus, em sua sabedoria, ensejou a sua própria revelação por meio dessa nova forma de comunicação. De qualquer maneira, parece que tanto o novo deus quanto a nova escrita atuaram juntos para formar uma nova nação e disseminar uma ideia que iria mudar o mundo." (pág. 115)

"[...]a literatura ugarítica baseada no alfabeto passou a fazer parte de uma tradição literária comum, e finalmente, 300 ou 400 anos mais tarde, passou a influenciar a dos hebreus. Talvez isso não deva causar surpresa, pois o ugarítico e o hebraico eram línguas intimamente ligadas, embora ainda possa parecer uma afronta, para alguns, vislumbrar as raízes do Velho Testamento em uma cultura rival, principalmente tratando-se de uma tão declaradamente pagã como aquela." (pág. 147)

"Como poderia ali haver uma cultura rica, se os seus pobres coitados não sabiam nem ler nem escrever? Como uma cultura poderia desabrochar inteiramente a partir de uma 'não-cultura'? Essa questão está por trás de um debate acadêmico que vem se estendendo desde 1795, quando o classicista alemão Friedrich Wolf sugeriu que Homero era iletrado." (pág. 177)

"No início do século V, os cidadãos atenienses tiveram uma oportunidade de escrever quando foram levados a votar a respeito do exílio de uma pessoa notoriamente perigosa. Os votos eram dados rabiscando-se um nome em um óstraco, aqueles fragmentos de cerâmica onipresentes que serviam de blocos de anotações. As pessoas que eram expulsas da cidade dessa maneira eram condenadas ao 'ostracismo'." (pág. 194)

segunda-feira, 22 de setembro de 2014

Desenganos

Título: Desenganos
Autor: Judith Michael
Páginas: 482

Sabrina e Stephanie são duas gêmeas, perfeitamente idênticas, porém, cada uma com personalidade própria. Desde pequenas estiveram sempre juntas e, com o passar dos anos, se tornaram cada vez mais unidas. Stephanie casa-se com um professor e constrói uma família enquanto Sabrina vive nas altas rodas da sociedade.
Mas ambas gostariam de viver a vida da outra. Num determinado momento decidem trocar de lugar para viver uma nova experiência. Mas as coisas nem sempre são tão fáceis quanto se imagina... Poderão as duas enganar suas famílias e amigos? Por quanto tempo?

Trechos interessantes:

"Em todas as conversas de fim de noite com as amigas sobre sexo, horas eram gastas sobre a maneira de dizer sim ou não, mas nem um único minuto sobre como tomar a iniciativa." (pág. 35)

"-Fale alguma coisa sobre a exposição de antiguidades. Sabe de uma coisa? Sempre tive o desejo secreto de acariciar uma estátua nua. Será que posso ter agora minha oportunidade? Têm algumas estátuas nuas?
Stephanie riu. Que dia maravilhoso iam ter.
-Temos estátuas de nus. Se quiser estátuas nuas, você terá que despi-las." (pág. 49)

"Você conhece a velha superstição chinesa, de que se olharmos diretamente para alguma coisa bela ela desaparece? Podemos lançar um olhar de lado, mas nunca de frente, porque coisas belas são frágeis e passageiras e um olhar duro poderia destruí-las. Sinto-me assim a respeito de minha vida. Se falar sobre ela, ou olhá-la de perto demais, tudo pode desmoronar." (pág. 100)

"Por que alguém não notava que havia alguma coisa de errado?
Porque as pessoas veem o que esperam ver. Ninguém tem razão alguma para esperar que eu não seja Stephanie. O que quer que eu faça, descobrirão uma maneira de explicá-la porque, a não ser assim, a coisa não teria sentido. Quando pessoas acreditam que alguma coisa é verdadeira, esforçam-se para fazê-la parecer assim." (pág. 162)

"Um homem precisava falar sobre seu trabalho, compartilhá-lo com a família. Se não podia, por mais importante o trabalho pudesse ser para o resto do mundo, de alguma maneira tornava-se insignificante - uma parte de sua vida que lhe consumia horas todos os dias, mas que não conseguia despertar o interesse das pessoas mais importantes em sua vida." (pág. 218)

"-[...]Por que você não quer o emprego?
-Porque os únicos assuntos que meus anfitriões abordaram hoje foram o mercado, o consumidor, o dólar por hora de pesquisa, o retorno do investimento. Porque, para eles, a fusão de genes significa um produto, como se eu estivesse dirigindo uma equipe de chefes de cozinha que elaboram um novo cereal para o desjejum. Porque o que querem fazer é o que se acha que devem: ganhar dinheiro. Porque o que eu quero fazer é o que a universidade espera que eu faça: pesquisa e ensino. Porque não quero ter que explicar o motivo por que estou seguindo uma nova pista promissora em pesquisa, mesmo que ela não venha a resultar, durante anos, num produto... se algum dia vier a ser isso. Porque não posso estudar os problemas de genética e ao mesmo tempo ver a linha de lucros e perdas num balancete contábil. Porque, droga, este não é o meu lugar." (pág. 329)

"Os brasileiros dizem que o amor é a última coisa, não a primeira. Ele cresce devagar com o compartilhamento e a criação. Quando se vive junto e se constrói uma família, o amor vem." (pág. 381)

sábado, 13 de setembro de 2014

O homem que via o trem passar

Título: O homem que via o trem passar
Autor: Georges Simenon
Páginas: 182

Kees Popinga é um holandês que trabalha numa das empresas do porto de Amsterdã. Mas, apesar de gostar do mar, ele tem uma paixão obsessiva por trens. Certa noite descobre que a empresa em que trabalha sofreu um desfalque e, diante da falta de perspectiva, resolve sair pelo mundo afora, abandonando a família e tudo mais, para viver uma vida cheia de aventuras.
Vai para Paris e se diverte fugindo da polícia e cometendo crimes enquanto todos o tomam por um maníaco descontrolado.

Trechos interessantes:

"Curioso que ninguém suspeitava que estivesse gagá. Instalavam-no todo dia numa poltrona, como uma múmia, ou como o símbolo vivo da empresa. Não deixavam que o vissem mais do que alguns instantes, e os fregueses tomavam por concentração o olhar perdido, e por sabedoria a ausência total de inteligência!" (pág. 30)

"-Todos os estrangeiros são estranhos. Talvez porque a gente não os entende." (pág. 75)

"Dizem que minha filha é uma menina inteligente, porque não fala, ou fala raramente. Mas é que não tem nada a dizer! [...] Quanto ao menino, não tem nenhum dos defeitos dos garotos da sua idade. E isso me alarma: provavelmente não fará nada na vida!" (pág. 118)

"Então, e de uma vez por todas: não sou louco nem maníaco. Apenas, aos quarenta anos, tomei a decisão de viver como me agrada, sem fazer mais caso das convenções ou das leis. Descobri - um pouco tarde, convenho - que ninguém as observa e que até agora eu vinha me deixando iludir." (pág. 121)

"Aborreci-me durante quarenta anos. Durante quarenta anos vi a vida como um pobre miserável que cola o nariz à vidraça de uma confeitaria e vê as pessoas comerem bolo.
Aprendi que os bolos são de quem os pega." (pág. 121)

"Que procurassem por ele o quanto quisessem! Que olhassem todo transeunte bem no rosto. O homem é sempre mais forte que a massa, desde que não perca o sangue-frio." (pág. 151)

sexta-feira, 5 de setembro de 2014

Morte de um dissidente

Título: Morte de um dissidente
Autor: Alex Goldfarb e Marina Litvinenko
Páginas: 454

O livro narra os bastidores da política russa que, apesar de não apresentar a mesma força da época da guerra fria, ainda desperta grandes interesses.

Alexander Litvinenko (Sacha) foi um agente da KGB na época de Boris Ieltsin. Com a ascensão de Putin ao poder, a relação de Sacha com o governo ficou instável,levando este a se exilar em Londres, temendo por sua vida. Apesar de todas as precauções Sacha foi envenenado e o livro descreve sua vida e suas atividades, procurando pistas para descobrir o responsável pela sua morte.

Trechos interessantes:

"Joseph explicou que, para pedir asilo, Sacha deveria primeiro ter entrado nos Estados Unidos. Fora dali, ele só poderia pedir um visto de refugiado, e havia uma cota anual. Teria de esperar meses, talvez anos." (pág. 26)

"Quando penso por que éramos tão felizes, acho que era porque podíamos ser nós mesmos, sem necessidade de fingir, de nos preocupar em ser atraentes, não havia nada a conquistar e nada a provar. Isso ficou óbvio para nós desde o primeiro dia, e era tão natural. Nenhum de nós jamais tinha pensado que algo assim fosse possível, e ficamos atônitos com isso até nosso último dia juntos." (pág. 49)

"O capitalismo na Rússia está apenas começando; afinal, é preciso antes de mais nada ganhar dinheiro, para poder doá-lo. Estou satisfeito de ver que tudo vai bem para vocês e de saber que dão a mesma importância que eu à ciência e à educação." (pág. 77/78)

"'Conheço um homem pelo aperto de mão', disse Sacha a Marina depois do encontro. 'O dele era frio e pegajoso. Eu podia ver em seus olhos que ele me odiava'." (pág. 180)

"Anos depois, numa caminhada por Londres, Sacha parou diante da inscrição na estátua de Oscar Wilde: 'Estamos todos na sarjeta, mas alguns de nós estão olhando para as estrelas'." (pág. 215)

"Uma vez, vi um rato enorme e corri atrás dele, até acuá-lo num canto. [...]Ele se virou e correu para cima de mim. Aquilo foi inesperado, e assustador. De repente o rato me caçava [...], mas fui mais rápido e bati a porta atrás de mim, no focinho dele. Foi assim que ele aprendeu, de uma vez por todas, o significado da palavra 'acuado'." (pág. 230)

"É claro que notei que havia qualquer coisa, que Naltchik era um disfarce. Achei que ele quisesse nos tirar de Moscou para nos proteger de algum perigo. Essas coisas acontecem na profissão, explicou Marina posteriormente. Mas, quando ele ligou, disse que talvez não pudéssemos voltar para a Rússia, nunca mais. Fiquei chocada. Para mim, aquilo era impensável, era como se me dissessem que eu tinha câncer, ou que alguém muito próximo estava envolvido num acidente de carro." (pág. 281)

"Diferentemente das alegações de cumplicidade no assassinato de uma criança inocente no século XVII, a suspeita de envolvimento na morte de 247 inocentes dificilmente derrubará o regime agora, não depois dos milhões de mortes semelhantes na moderna história russa, escreveu Zarakhovitch. Apesar disso, quanto mais as coisas pioram, mais o povo falará. Um dia, a conversa pode mais uma vez evoluir para um rugido." (pág. 317)

"O governo é acusado de matar grande número de cidadãos russos, e metade do povo acredita; para mim isso basta. A presunção de inocência não se aplica aos governos; é um mecanismo para proteger as pessoas contra abusos do governo. Putin tem a obrigação de afastar as suspeitas." (pág. 325)

"[...]a razão que o levara a escolher aquele lugar fora um velho ditado tchetcheno: 'Primeiro conhece o teu vizinho, depois constrói tua casa perto dele'." (pág. 375)

"Na verdade, eu estava começando a conhecer Marina. E recordaria nossa conversa mais tarde, depois da morte de Sacha, quando ela decidiu enfrentar a mídia. E o fez com força e graça, apesar de sua aversão á notoriedade, como um dever para com Sacha, como a mulher do pioneiro, que deixa de lado a roupa por lavar e pega a espingarda do marido morto para defender o lar." (pág. 407)

sábado, 16 de agosto de 2014

Histórias para dar calafrios

Título: Histórias para dar calafrios
Autor: Alfred Hitchcock
Páginas: 224

Coletânea com treze histórias de suspense, com estilos variados, algumas boas, outras nem tanto.

Entre as minhas preferidas estão "A inspiração", "Dedos leves" e "Motivos justos para matar".

Trechos interessantes:

"Como eu disse à minha mulher quando ela voltou das compras na semana passada, não é de admirar que tantos garotos estejam tomando o mau caminho. Voltam para casa da escola e encontram as mães vestidas com um saco amarrado com um cinto. Isso é suficiente para fazer a garotada ganhar as ruas." (pág. 28)

"Gonzales tinha boa mente e olho para detalhes. Possuía também imaginação, o que para uma investigação policial era a mesma coisa que argamassa para um pedreiro." (pág. 29)

"Acho que, depois da malária, a curiosidade é a doença mais demoníaca que pode afligir um corpo humano. E é a coisa mais humanizadora que existe, logo em seguida ao nascimento; e, pelo que sei, tampouco se pode resistir a ela." (pág. 88)

"Uma única palavra. Ódio. Guerras eram iniciadas com ela. Podia-se explodir o mundo com ela." (pág. 117)

"-Estávamos falando sobre vodu, senhor. A cozinheira acredita piamente nisso.
-Esta é obviamente a razão por que ela é uma cozinheira e não uma imperatriz." (pág. 170)

"O presidente Kennedy era protegido pelo FBI, pelo serviço secreto e por metade da força policial de Dallas. Um único homem pegou-o. É um fato lamentável, mas é verdade.
Estamos apenas tentando demonstrar ao senhor que os melhores cães de guarda, guardando cada um de vocês dia e noite, não constituem garantias de segurança." (pág. 201)

terça-feira, 29 de julho de 2014

Um pressentimento funesto

Título: Um pressentimento funesto
Autor: Agatha Christie
Páginas: 228

Particularmente, gosto mais dos livros de Agatha Christie que tem como personagem principal Hercule Poirot. Este, cuja dupla de detetives são Tommy e Tuppence, não fez muito o meu estilo. Normalmente as histórias de detetive demoram a engrenar e esta, achei que demorou mais ainda.

Tudo começa com a visita a um asilo onde está a tia de Tommy. Pouco depois esta tia morre e deixa alguns pertences, entre eles um quadro com uma paisagem rural. Tuppence fica obstinada pelo quadro e pelo que ouviu de outra paciente quando da visita ao asilo. Juntando todas as coisas resolve desbaratar o mistério e parte em busca do local retratado na tela. Depois de quase tudo resolvido, aparece Tommy para fechar a história. Em suma é isso.

Trechos interessantes:

"Se alguém é ruim como cobra aos vinte, não melhora nada aos quarenta, piora aos sessenta e se transforma numa perfeita peste aos oitenta - bem, francamente, não sei por que havia de me causar qualquer comiseração apenas pelo fato de ter envelhecido. No fundo, ninguém muda." (Pág. 8/9)

"Se alguém de mais de sessenta e cinco anos recrimina a gente, é preferível não responder. Nunca tente provar que tem razão. Desculpe-se logo, dizendo que a culpa é unicamente sua, mostre-se sentido e prometa que o erro não se repetirá." (pág. 15)

"Três vintenas de anos e uma década correspondiam à duração de vida consagrada na Bíblia, e as mortes em sua instituição raramente ocorriam em prazo inferior. Consituíam uma fatalidade perfeitamente natural." (pág. 28)

"-Estive pensando.
-É de onde se originam todos os problemas da vida. Pensar." (pág. 169)

"Pensar consiste apenas num confortável repouso enquanto o espírito mantém as antenas abertas pra eventualidade de captar algo de interesse ou importância flutuando no ar." (pág. 177)

"Eles [habitantes do campo] marcam as datas pelos acontecimentos, não pelos anos. Não dizem 'isso aconteceu em 1930' ou 'aquilo foi em 1925', ou coisa que o valha. Dizem 'isso aconteceu no ano em que o velho moinho pegou fogo' ou 'aquilo sucedeu depois que o raio derrubou o carvalho gigante e matou o granjeiro James' ou 'foi no ano em que houve a epidemia de paralisia infantil'. De forma que, naturalmente, as coisas de que se lembram não obedecem a uma sequência especial." (pág. 208/209)

domingo, 20 de julho de 2014

Tão mais bonita

Título: Tão mais bonita
Autor: Cara Hoffman
Páginas: 286

A história não é contada de forma sequencial, o que fez com que eu demorasse a me situar no contexto. Isso é uma deficiência do leitor, não do livro. O livro mantém o suspense até quase o final.

Em resumo: cidade pequena dos Estados Unidos, uma garota desaparece  e depois de muito tempo é encontrada morta. Todos se perguntam quem poderia ter feito isso. Paralelamente é contada a história de Alice, filha de ex-hippies que se mudaram para lá. Alice terá importante participação no desenrolar da história. O final pode te surpreender.

Trechos interessantes:

"Quando White sumiu, a estupidez se tornou uma forma de boa educação. Quem não fingisse estupidez provocaria indignação e recriminações, como se devesse ser óbvio para todos que o silêncio precisava ser instituído para que tudo aquilo simplesmente desaparecesse." (pág. 32)

"Deviam ter sentido pena e suposto que era burra, tímida ou ingênua, ou que não poderia pensar nada de ruim sobre gente magra, rica e simpática. Não poderia ter ideias próprias sobre as coisas. Mas, agora, conseguiriam vê-la. Quanto menos maquiagem usava, mais magra ficava; todos simplesmente suporiam que estava ficando mais inteligente, também. Não pensariam que sempre fora inteligente, não perceberiam que sempre fora bonita, também." (pág. 51)

"Ser bom numa coisa não obriga a gente a fazer essa coisa. Era um erro pensar assim. E ele cometera muitos erros por lhe dizerem tantas vezes que era a pessoa certa para algum serviço especial, ou projeto, ou movimento social." (pág. 68)

"Saí voluntariamente de um lugar que amava porque me tornara egomaníaca. Acreditava, sinceramente, que reportagens de jornal poderiam mudar o jeito como o mundo funcionava. E isso significava que eu conseguiria mudar o jeito como o mundo funcionava. E essa não é uma ideia muito saudável para um ser humano." (pág. 87)

"Então, a coisa mais maluca do mundo é achar que a gente pode dizer aos outros o que fazer - ou pensar que algumas pessoas merecem tratamento melhor ou mais coisas do que as outras - porque todos os seres humanos têm as mesmas necessidades biológicas e merecem as mesmas coisas essenciais." (pág. 102/103)

"Tomo meus desejos por realidade, pois acredito na realidade de meus desejos." (pág. 203)

"Quanto mais vivo, mais percebo o impacto da atitude na vida. Para mim, atitude é mais importante do que fatos. É mais importante do que o passado, do que a educação, do que o dinheiro, do que as circunstâncias, do que os fracassos, do que os sucessos, do que o que os outros pensam, dizem ou fazem. É mais importante do que a aparência, talento ou habilidade." (pág. 259/260)

quinta-feira, 10 de julho de 2014

Você deve amar os cães

Título: Você deve amar os cães
Autor: Claire Cook
Páginas: 288

Sarah é uma mulher de 40 anos, divorciada, professora do jardim de infância e que, sentindo-se solitária, resolve que é hora de procurar um companheiro. Como não tem muito jeito pra coisa, resolve colocar um anúncio no jornal sendo uma das condições que o pretendente deva gostar de cães.

O problema é que há muitas pessoas para 'ajudar': a irmã, a colega de trabalho, o pai (um viúvo mulherengo), etc. E ainda por cima, ela mesma, não tem nenhum cão...

Trechos interessantes:

"Deus detesta a superficialidade. Todos nós dizíamos isso uns aos outros, ainda que fôssemos orgulhosos de nossa superficialidade. Políamos esse aspecto de nossa personalidade até brilhar; era nosso brasão de família." (pág. 40)

"-E o que vocês, seus pequenos travessos, estão procurando tão contentes aí embaixo? Não sabem que a felicidade é para a próxima vida?" (pág. 50)

"Quando uma criança se machuca, tudo o que uma professora quer fazer é colocar o braço em torno de seus ombros e confortá-la, mas nos dias de hoje você tem de estar de luvas antes de fazer contato." (pág. 65)

"Os artigos da Victoria's Secret sempre me faziam sentir como se eu fosse uma impostora. Como se no minuto em que tiro um cabide acolchoado de cetim da arara da parede para examinar aquela camisola macia de renda um pouco mais de perto, um alarme fosse soar em algum lugar. Um facho de luz fosse iluminar minha face e uma loja cheia de mulheres glamourosas fosse me apontar, dizendo: Ah-há! Vê se pode!" (pág. 97)

"-Então, Dolly - ouvi Bob dizer enquanto eu seguia Carol. -Tinha pensado em lhe perguntar, você está usando essa touca para o caso que chova e haja um vazamento no telhado? Ou apenas porque fica assim tão bem em você..." (pág. 141)

"Eu sempre fora induzida a pensar que, se não pudesse encontrar alguma coisa para apreciar em uma pessoa, isso se devia meramente a um reflexo da pequenez de minha mente, da frieza de meu coração." (pág. 179)

"A dor não foi intensa e então eu abri os olhos de novo, só uma fresta, julgando que não deveria perder nada daquele momento ou de qualquer outro. Afinal, a vida era danada de curta para não ser vivida a cada instante." (pág. 246)

"-Bem, algumas vezes eu acho que a única parte que me prende é a parte das crianças. Phoebe e eu somos tão diferentes. Quem somos, do que gostamos. Pensei que, se a gente encontrasse alguém para amar, o resto se encaixaria no lugar." (pág. 270)

domingo, 29 de junho de 2014

A situação humana

Título: A situação humana
Autor: Aldous Huxley
Páginas: 264

Eis um dos melhores livros que já li. O livro é uma coletânea de conferências proferidas pelo autor na Universidade da Califórnia, em 1959, abordando o relacionamento do homem com o planeta.

Não se deixe enganar pela data, apesar de muito antigo os textos parecem que foram feitos para os dias de hoje, comprovando a visão de futuro que tinha Huxley. O comportamento humano é aqui esmiuçado em todos os níveis levando o homem a questionar e repensar o seu papel, a sua função neste planeta.

Trechos interessantes:

"Como sabemos, aprender pouco é algo perigoso. Mas uma boa porção de aprendizado altamente especializado também é uma coisa perigosa, e por vezes pode ser ainda mais perigoso do que aprender só um pouco." (pág. 11)

"Quando chegarmos ao fim, teremos coberto uma boa porção de terreno e também estaremos muito entediados com o que tenho a dizer, mas felizmente poderei então sumir discretamente." (pág. 21)

"...como disse Chateaubriand, 'les forêts précèdent leus peuples, et les déserts les suivent' (as florestas precedem as civilizações, e os desertos as seguem)." (pág. 23)

"O homem tem vivido demasiadamente no Planeta à moda de um parasita que se sustenta daquele a quem infesta. Se muitos parasitas são bastante ajuizados para não destruírem seu hospedeiro porque destruiriam a si mesmos, o homem não é um desses parasitas ajuizados." (pág. 25)

"...como disse alguém, a maior lição da história é que ninguém jamais aprende as lições da história." (pág. 33)

"Hoje sabemos o suficiente para consertar boa parte do prejuízo causado ao nosso Planeta e evitar que ocorram novos danos. A informação e conhecimento necessários existem. Mas, como de costume, há uma grande lacuna entre a habilidade para fazer uma coisa e a probabilidade de que ela seja feita. É muito fácil descrever os métodos de conservação que deveriam ser postos em prática de imediato, mas é extraordinariamente difícil executar o que sabemos que somos capazes de fazer." (pág. 38)

"Precisamos tratar o Planeta como se fosse um organismo vivo, com todo o amor, cuidado e compreensão que um organismo vivo merece. Se não o tratarmos assim, destruiremos o mundo no qual vivemos, e esse mundo destruído voltar-se-á contra nós e nos destruirá." (pág. 40/41)

"...todas as espécies vivem segundo seu suprimento de comida, e depois são eliminadas na medida em que seu número excede o alimento." (pág. 54)

"...embora seja bem verdade que o homem não pode viver só de pão, menos ainda poderá viver sem pão, e, se não conseguirmos pão suficiente, não conseguiremos nada mais. Apenas quando o homem tiver pão, apenas quando sua barriga estiver cheia, haverá alguma esperança de que, da situação humana, emerja alguma coisa mais." (pág. 63/64)

"si vis pacem para bellum - se queres a paz prepara-te para a guerra (provérbio romano)." (pág. 89)

"Como disse Lord Acton, 'O poder tende a corromper, e o poder absoluto corrompe de maneira absoluta'." (pág. 90/91)

"Nenhum adivinho dos que conhecemos jamais fez fortuna predizendo o futuro, mas nenhuma companhia de seguros jamais entrou em falência. O motivo é que a companhia de seguros prevê o futuro de milhões e por isso pode ter certeza de lucro, enquanto o adivinho prevê a sorte de apenas uma pessoa, e provavelmente terá mais chances de errar do que de acertar." (pág. 104)

"Quando cheguei a este país, há dez anos, tive a maior dificuldade em encontrar meios para minha pesquisa básica. As pessoas me perguntavam: o que está fazendo, para que serve isso? Eu tive de dizer que não servia para coisa alguma. Então perguntavam: mas então o que é exatamente que você vai fazer? E eu tinha de responder: não sei, pesquisa é isso mesmo. Assim, a pergunta seguinte era: como espera que gastemos nosso dinheiro com você, se nem sabe o que está fazendo, nem por que o faz? E a essa pergunta eu não podia responder." (pág. 111)

"Como diz o Dr. Johnson, 'acontecimentos públicos não molestam o homem' e as notícias de uma batalha perdida nunca fizeram com que 'um homem comesse menos ao jantar'. E, vice-versa, as notícias de uma novidade científica ou de uma grande descoberta jamais fizeram um homem comer mais ao jantar." (pág. 127/128)

"Edison disse que gênio é nove décimos de transpiração e só um décimo de inspiração, mas tem de haver primeiro inspiração, depois o trabalho sobre ela." (pág. 164)

"A linguagem é o que nos torna humanos. Infelizmente, é também o que nos torna humanos demais. De um lado, é a mãe da ciência e da filosofia, e de outro produz toda a sorte de superstição, preconceito e loucura. Ajuda-nos e nos destrói; torna possível a civilização e também produz aqueles assustadores conflitos que degradam a civilização." (pág. 175)

"Quase não há um só crime em grande escala na história que não tenha sido cometido em nome de Deus. Isso foi resumido há muitos séculos no hexâmetro de Lucrécio: 'Tantum religio potuit suadere malorum' (Tão grandes males a religião persuadiu o homem a cometer)." (pág. 208)