sexta-feira, 29 de julho de 2016

As filhas sem nome

Título: As filhas sem nome
Autor: Xinran
Páginas: 290

Inconformado pelo fato de não ter filhos homens, um pai resolveu que não colocaria nome nas filhas, de tal forma que elas foram sendo chamadas simplesmente por números, na ordem que iam nascendo... A filha Três, determinada a mudar de vida, saiu da aldeia rural e foi para a cidade grande, iniciar uma nova vida. Depois de Três (e induzida por ela) partiram também Cinco e Seis.

O livro relata a adaptação delas aos costumes da cidade, entremeadas pela lembrança constante das orientações da mãe. O livro procura mostrar a discriminação com que as mulheres chinesas são tratadas e a tentativa de algumas dessas mulheres a mudarem os hábitos tão arraigados em sua cultura. Para nós, ocidentais, parece um absurdo que ainda existam coisas semelhantes no mundo...

Trechos interessantes:

"Sua filosofia era que, se alguém não tem dinheiro para se divertir, é necessário jogar um pouco de conversa fora para dar cor à vida, senão a pessoa enlouquece de tédio." (pág. 24)

"Ela se lembrava das palavras da sua mãe: 'Se alguém salva a sua vida com um gole de água, nem mesmo cavar um poço será o suficiente para retribuir esse gesto'." (pág. 30)

"As pessoas com melhor nível de educação imediatamente ficaram com uma pulga atrás da orelha. Para elas, tratava-se apenas de mais uma manobra política disfarçada, e era melhor não se envolver. Afinal de contas, o primeiro porco a engordar é o primeiro a ir para a mesa." (pág. 53)

"Talvez na cidade houvesse mais respeito pela ideia de beleza. Seis pensou com tristeza nas garotas que haviam sido suas colegas no primário e que agora estavam todas casadas. Se tentassem parecer bonitas, tornavam-se motivo de escárnio. Isso era algo que simplesmente não se fazia." (pág. 92/93)

"Sabia que todos a tomavam por uma idiota, então seguia o conselho de sua mãe: 'Não abra a boca, assim ninguém, por mais inteligente que seja, poderá fazer você de boba'." (pág. 115)

"'Oh, Cinco',Três disse, 'usar as coisas dos outros não é a mesma coisa que pegar emprestada alguma coisa da sua família! O que a mãe nos disse antes de partirmos? Mesmo se não há arroz na casa da sua família, é melhor morrer de fome do que pegar o mingau das outras pessoas'!" (pág. 130)

"Um chinês que começara havia pouco tempo a aprender inglês deu um encontrão em um inglês na rua e pediu desculpas em inglês: I am sorry. O inglês respondeu I am sorry too. O chinês, pensando que precisava ficar à altura da educação do inglês, disse: I am sorry three. O inglês não entendeu: What are you sorry for? O chinês, determinado a não passar por uma pessoa rude, disse: I am sorry five." (pág. 138/139)

"Os antigos costumavam dizer que 'o homem sábio não demonstra medo diante do inesperado e não demonstra raiva diante de acusações injustas'." (pág. 155/156)

"Se as pessoas não têm ninguém com quem se comparar, não sabem que estão sofrendo injustiças. São as comparações que deixam as pessoas infelizes: aqueles que não sabem o que é uma fortuna, não sabem o que é a pobreza. Somos tão pobres aqui que nem mesmo os oficiais da vila vêm nos visitar. Por que quereriam? O que ganhariam com isso? Um bocado de água salgada e uma fatia de pão de batata-doce... Se eu saísse por aí falando sobre a vida das pessoas ricas para todos, acha que gostariam de mim? Quanto menos as pessoas tiverem de se preocupar, melhor. Podem ser pobres, mas estão em paz. Não causam problemas, e isso é o mais importante." (pág. 220/221)

"Felicidade é saber aceitar o próprio destino..." (pág. 221)

"'O marido a trata bem?', perguntei.
A jovem olhou para mim como se eu fosse um ser extraterrestre. O que 'bem' e 'mal' significam para ela? Você apenas vai com a pessoa com a qual os seus pais a casam, independentemente de quem seja! Esse foi o destino de milhões de mulheres chinesas desde o início dos tempos..." (pág. 271)

quarta-feira, 27 de julho de 2016

Operação Perfeito

Título: Operação Perfeito
Autor: Rachel Joyce
Páginas: 304

Byron, um garoto de 11 anos, foi informado pelo colega que dois segundos seriam adicionados ao tempo para corrigir a sincronia do movimento da Terra. Byron ficou tão perturbado com a notícia que, qualquer coisa diferente que acontecia, ele atribuía ao acréscimo dos dois segundos. E várias coisas aconteceram...

A mãe se mata, o pai o abandona, o melhor amigo se muda, ele transforma-se num paranoico, passa por instituições de apoio e nunca mais consegue ser uma pessoa normal. Tudo isso começou por causa dos dois segundos... Livro tenso e sombrio, mas interessante.

Trechos interessantes:

"-A gente vai se atrasar.
-A gente nunca se atrasa - disse Byron. Era uma regra do pai deles. Um inglês deve sempre ser pontual.     (pág. 19)

"James Lowe contou para Byron, certa vez, que fazer mágica era uma questão de brincar com a verdade. Não era uma mentira. O que as pessoas viam, disse ele, dependia muito do que estavam procurando." (pág. 34)

"-[...]Embora seu pai seja um homem muito inteligente, é claro. Muito mais do que eu. Nunca li um livro do começo ao fim.
-Você lê revistas. Você lê livros de receita.
-Sim, mas eles têm fotos. Livros inteligentes só têm palavras." (pág. 39/40)

"Existem lacunas em sua memória, lacunas de semanas, de meses, e às vezes até de mais. Relembrar o passado é como viajar para um lugar onde ele esteve uma única vez, e descobrir que tudo foi suspenso e desintegrado." (pág. 72)

"Paula diz que o problema é que pessoas como Jim são boas demais. E ele sabe que o problema não é esse. O problema é que as pessoas precisam que outras pessoas - como Eileen - sejam ruins demais." (pág. 130)

"Eles conversam sobre várias coisas. A jardinagem dele, as novidades no café do supermercado. Quando ele descreve o aconchego ela gargalha bem alto, e ao ouvi-la gargalhando ele também enxerga o lado engraçado da história, e não sente mais medo. Ele pensa no quanto gostaria de ter aquilo na vida, a gargalhada dela, sua forma de enxergar as coisas, e se pergunta se é isso que as pessoas buscam em um parceiro ou amigo: a parte de si mesmos que está faltando." (pág. 212)

"Às vezes é mais fácil, pensa ele, viver os erros que cometemos do que reunir a energia e a imaginação necessárias para consertá-los." (pág. 294/295)

segunda-feira, 25 de julho de 2016

Contos maravilhosos caucasianos - Saga Azerbaijana

Título: Contos maravilhosos caucasianos - Saga Azerbaijana
Autor: Imam Raguza
Páginas: 118

O livro apresenta uma tradução do sueco para o português dos contos comuns aos povos da região do Cáucaso. São contos semelhantes às nossas lendas e que são transmitidos, geralmente, de forma oral de uma geração à outra. Na essência, os contos se assemelham a muitos outros que são comuns à nossa cultura, mudando-se apenas as personagens.

Encontrei o livro por acaso na biblioteca da escola em que trabalho e, mais por curiosidade que por prazer, me dediquei à sua leitura. A história em si é simples, o livro é pequeno e apresenta uma fonte com tamanho grande, possibilitando a conclusão da leitura em poucos minutos.

Trechos interessantes:

"Antes,
ele se orgulhava só de imaginar que,
em nenhum outro lugar do mundo,
houvesse alguém que,
em generosidade,
dele pudesse sequer se aproximar.

Mas agora estava convencido de que,
em verdade,
Ferbad era mais generoso do que ele." (pág. 22/23)

"Com esta voz,
você não pode ser o nosso muezzin.
Entre a sua voz e a dele,
a diferença é tão grande
quanto a distância entre o céu e a terra." (pág. 44/45)

"Somente agora,
eu pude entender
o que significavam
aquelas palavras de minha mãe,
bem como o tipo de pessoas
que eram os meus amigos,
e o quanto me haviam enganado." (pág. 92/93)

domingo, 17 de julho de 2016

Livro de Ana

Título: Livro de Ana
Autor: Ursulino Leão
Páginas: 188

O livro data de 1972 e é uma coletânea de crônicas que o autor publicou nos jornais da região, no período de 1951 a 1967. Quase todas estão relacionadas à cidade de Anápolis, cidade bem conhecida e admirada por Ursulino Leão.

A crônica é um gênero temporal, ou seja, geralmente está ligada a um período específico. Ela é importante para conhecermos as necessidades e os problemas vivenciados, nesse caso, pela população de Anápolis no período mencionado. Mesmo assim, muitos dos problemas citados ainda estão em voga até os dias de hoje...

Trechos interessantes:

"Naqueles velhos tempos, eram outras as brincadeiras e a infância se prolongava, bendita e alegre. A fabricação de brinquedos não atingira ainda o espantoso desenvolvimento de hoje. Não se viam bonecas que andam. Nem bichos que correm. E os poucos velocípedes que se vendiam, custavam o olho da cara. A meninada, pois, se largava para as pescarias estabanadas. Ou ia caçar passarinhos nas redondezas. Ou, simplesmente, vagabundeava..." (pág. 20)

"Pôncio Pilatos, examina-o Fulton Sheen, visando as relações da Religião com a Política. E se aprofunda no assunto magnífico, considerando a supremacia que o político, sobre o espiritual, vai alcançando no mundo de hoje. O Pilatos, dos templos bíblicos, figura o Estado onipotente que desconhece limites ao seu poder. E é uma advertência: 'o grande perigo de agora, não é a religião na política, mas a política na religião. Tendem os Estados a dominar a família, a cultura e a alma. Haverá, no futuro, uma religião de Deus e uma religião do Estado'." (pág. 28)

"É para buzinar, a buzina. Não há dúvida. Mas buzinar à toa, não. Floresta de Miranda, na 'Tribuna da Imprensa', tratando de assuntos referentes ao tráfego, salientou que o motorista britânico não usa buzina. Embora não haja proibição nesse sentido. 'Ou o caminho está livre e, nesse caso, ela não se faz necessária, ou está impedido, e também não é preciso usá-la', afirma o comentarista. Mas, uma buzinada, de quando em quando, talvez seja útil. Rápida, educada. A título de aviso. Buzinar a cada momento, ensurdecedoramente, sem motivo algum, valha-me Deus, ó choferes!" (pág. 34)

"Goiaz, sem 'z', com aquele acento antipático, por cima, é o mesmo que Bahia sem 'h'. Às favas a Gramática e viva o gosto da gente!" (pág. 36)

"A gente tolera, com algum esforço,que a velha Colônia não haja combatido a brutal destruição de nossas florestas. A sua economia repousava na monocultura, que se nutre de grandes áreas, insaciavelmente. A administração portuguesa, ávida de lucros, não atinava com a necessidade de poupar as matas brasileiras. E o colono, por sua vez, cuidava apenas de enriquecer. À sua prosperidade pouco importava que a terra fosse ou não rudemente espoliada." (pág. 53)

"Na verdade, pintura moderna é estranha arte!" (pág. 95)

"[...] de tudo o que vimos, muita coisa, sem dúvida, me fugiu à compreensão. Estava, porém, comigo a palavra - explicação e estímulo - de Picasso: 'todo o mundo quer compreender a pintura. Por que não buscar compreender o canto de um pássaro? Por que amamos a noite, as flores, tudo que nos rodeia, sem precisar compreender? Mas no caso de um quadro as pessoas fazem questão de compreender'." (pág. 96)

"Como aquele réu, citado por J. Pinto Loureiro, que, no Tribunal do Júri, depois de ouvir a própria biografia, narrada pelo seu defensor, confessara não saber que havia sido tão desgraçado, - convém a paráfrase - faz bem provável que nem todo advogado sinta o quanto se faz necessária a sua presença atuante no mundo de hoje." (pág. 168)

domingo, 10 de julho de 2016

Histórias de arrepiar os cabelos

Título: Histórias de arrepiar os cabelos
Autor: Alfred Hitchcock
Páginas: 206

Mais uma coletânea de histórias de mistério e suspense, organizadas sob o nome do mestre do suspense. Em alguns dos livros desta série há um texto introdutório (somente para jogar conversa fora), como tendo sido escrito pelo próprio Hitchcock. Este exemplar é um deles.

O livro reúne um total de 14 histórias de gêneros variados. De todas, apenas cinco delas chamaram a minha atenção. Destaco especialmente  "Ódio às crianças" e "Variações de um episódio".

Trechos interessantes:

"-É - disse Gus. -Femme fatale. É o que ela era, isso mesmo... fatal. E existem cinco homens, mortos há quarenta anos, para provar. E de fato, se não fosse um acaso da sorte, eu estaria morto como eles. - Meneou a cabeça com tristeza. -E tudo por causa do amor. É uma coisa perigosa esse tal de amor. Tudo que tenho a dizer é: não se meta com ele. O amor é mais forte do que qualquer pessoa." (pág. 18)

"Martha concluiu que estava falando com uma daquelas raras pessoas que não gostavam de admitir seus impulsos suicidas. A maioria dos suicidas em potencial não tinha esse tipo de constrangimento. A antiga crença de que as pessoas que ameaçavam suicidar-se nunca o faziam já havia sido desmentida há muito tempo. Conhecia histórias de muitos suicidas que haviam ameaçado repetidas vezes de tirar a própria vida antes de fazê-lo realmente. No entanto, havia casos em que o suicida não dava nenhum aviso antecipado." (pág. 27)

"Entendo um pouquinho de tudo. Meu cabedal de conhecimentos gerais é talvez maior do que a média, se quer saber a verdade, mas com relação a falsificação, não sou ninguém. Nem mesmo sei como se escreve.
Cédulas falsas e moedas nunca me atraíram nem um pouco. Na verdade, a ideia de falsificar dinheiro nunca me agradou. Gosto muito do verdadeiro para meter-me com substitutos baratos." (pág. 64)

"Um sonho pode ser mais importante do que a própria vida..." (pág. 96)

"Bateu levemente sob os números cromados: 421. Uma joia mnemônica, o segundo número era a metade do primeiro, o terceiro a metade do segundo. Lembrando-se do primeiro, sabe-se os outros." (pág. 177)

domingo, 3 de julho de 2016

O sobrevivente

Título: O sobrevivente
Autor: Aleksander Henryk Laks / Tova Sender
Páginas: 174

O livro relata os horrores testemunhados por uma pessoa que escapou de Auschwitz. Os livros de história nos ensinam sobre as atrocidades do holocausto, mas nada se compara ao relato de alguém que viveu na própria pele todo tipo de sofrimento.

O sobrevivente não era brasileiro (como faz crer o subtítulo), mas um polonês que, após escapar de Auschwitz, conseguiu se radicar no Brasil. Para quem gosta de relatos biográficos e quer aprender um pouco mais sobre história, eis aí uma boa dica.

Trechos interessantes:

"Achávamos que ganharíamos a guerra contra Hitler. Éramos ingênuos; não havíamos vivenciado ainda nenhum tipo de violência na nossa curta e feliz infância." (pág. 25)

"Os judeus tiveram que executar trabalhos forçados, como fazer faxina nos quartéis sem material de limpeza, com as próprias mãos. Igualmente com as mãos limpavam as ruas e os bueiros. Eram obrigados a passar por todo gênero de humilhações, como cavar valas, tirar a roupa e atirar na vala, e dançar sobre a roupa cantando os cânticos sagrados." (pág. 35)

"Eram muitos os enfermos, mas não havia nenhum medicamento. Entre nós, difundiu-se a crença de que a casca de batata continha todas as vitaminas, além de elevadas qualidades terapêuticas para as enfermidades e pestes que grassavam no gueto. Durante todos aqueles anos, a casca de batata foi o nosso remédio." (pág. 44)

"As deportações prosseguiam, ninguém sabia para onde. Nós, que permanecíamos no gueto, defendíamos a nossa sanidade mental tentando não acreditar no pior. Nós nos enganávamos para sofrer menos. Enganávamos uns aos outros. Sobreviver tornou-se uma obsessão. Investíamos todas as nossas forças numa só direção: sobreviver, sobreviver, obter mais um pedaço de pão, um pouco de sopa, um dia a mais, conseguir acordar no dia seguinte. Evitávamos fazer conjecturas quanto àquilo que temíamos." (pág. 59)

"Tenho muitas marcas. Tenho cicatrizes de todo tipo. Minha alma está cheia delas. Meu corpo também. Minha memória, meu pensamento, meu sono, meus sonhos, meus dias e minhas noites." (pág. 111)

"-Meu filho! Não posso andar, mas você deve prosseguir. E, se sobreviver, jamais deixe de contar o que nos ocorreu. Sei que não entra na cabeça de ninguém que algo assim possa acontecer; que seres humanos possam chegar a um nível tão baixo de crueldade e fazer o que fizeram a outros homens. Mas você tem que contar. Se pelo menos uma pessoa acreditar, você já terá feito a sua parte." (pág. 127)

"O fim da guerra e a nossa libertação marcaram o início de uma outra batalha. Tínhamos que recomeçar; sem parentes, casa, dinheiro, comida, roupas ou documentos. Nada. Além de tudo, permanecíamos no meio de gente hostil. Ninguém se importava com a nossa situação, e continuávamos abandonados. Ninguém veio ajudar; não havia comida, médicos ou remédios. Eles nos libertaram por acaso. Nós estávamos lá, simplesmente..." (pág. 149/150)

"Espero que o meu passado não seja o futuro das gerações que estão por vir. Procuro mostrar aos jovens como as mentes das pessoas foram esvaziadas e dominadas por um louco, por ideias absurdas, e como se perdem o controle e o discernimento dos próprios atos. Alerto sempre para esse perigo..." (pág. 167)

sexta-feira, 1 de julho de 2016

Contos novos

Título: Contos novos
Autor: Mário de Andrade
Páginas: 152

Encontrei o livro por acaso e, folheando, comecei a ler um dos contos (O poço). Entusiasmei e levei o livro pra casa para ler o restante. O bom dos contos é que são histórias curtas e pode-se ler em pequenos intervalos.

São nove contos, no total, e ainda uma análise detalhada de cada conto, típico para que vai prestar vestibular. No fim do livro há ainda alguns testes sobre o conteúdo. De todos os contos o que mais gostei foi realmente "o poço".

Trechos interessantes:

"Ia devagar porque estava matutando. Era a esperança dum turumbamba macota, em que ele desse uns socos formidáveis nas fuças dos polícias. Não teria raiva especial dos polícias, era apenas a ressonância vaga daquele dia. Com seus vinte anos fáceis, o 35 sabia, mais da leitura dos jornais que de experiência, que o proletariado era uma classe oprimida. E os jornais tinham anunciado que se esperava grandes 'motins' do Primeiro de Maio, em Paris, em Cuba, no Chile, em Madri." (pág. 47/48)

"Só quem estava imaginando que enfim se arranjara na vida era o vigia, esse, um caipira da gema, bagre sorna dos alagados do rio, maleiteiro eterno a viola e rapadura, mais a mulher e cinco famílias enfezadas. Esse agora, se quisesse, tinha leite, tinha ovos de legornes finas e horta de semente. Mas lhe bastava imaginar que tinha. Continuava feijão com farinha, e a carne-seca do domingo." (pág. 83)

"Ora em mim sucede que a inveja não consegue nunca se resolver em ódio, nem mesmo em animosidade: produz mas uma competência divertida, esportiva, que me leva à imitação." (pág. 107)

"O melhor alívio para a infelicidade da morte é a gente possuir consigo a solidão silenciosa duma sombra irmã. Vai-se pra fazer um gesto, e a sombra adivinha que a gente quer água, e foi buscar. Ou de repente estende o braço, tira um fiapo que pegou na vossa roupa preta." (pág. 120/121)