quinta-feira, 1 de janeiro de 2009
O amanuense Belmiro
Título: O amanuense Belmiro
Autor: Cyro dos Anjos
Páginas: 218
O livro, seguindo a forma de diário, retrata a pacata vida do funcionário público Belmiro. Ele, pessoa modesta, nutre uma paixão não declarada pela jovem Carmélia, moça da alta sociedade de Belo Horizonte.
A narrativa é lenta e, sendo em primeira pessoa, reforça ainda mais o lado tímido e retraído do protagonista. No fim da história, Carmélia casa-se com outro e Belmiro volta à realidade de rapaz simples que sempre foi.
Trechos interessantes:
"Tempo velho. Velho Belmiro. Hoje é o nosso dia. Enquanto a fogueira funcionar, nós ficaremos de braços dados, nem tristes, nem alegres, apenas nos namorando e nos lembrando daquela moça de cabelos de retrós e de brancas vestes, que cantava inefável modinha. (...) Vamos perambular pela rua, contemplando as
fogueiras e cantando certa modinha que ninguém ouvirá". (pág. 48)
"-Olá, amigo Porfírio, você no meu antro! Galernos ventos o trouxeram". (pág. 58)
"Desde que se inventou a datilografia, e as mulheres (de preferência moças e bonitas) têm sido ocupadas nesse ministério, as complicações se multiplicaram na face da terra". (pág. 71)
"Tive ímpeto de passar-lhe a mão pelos cabelos e (por que não?) de dar-lhe uns beijos que não seriam senão paternais. (...) Mas o gesto morreu no pensamento e os beijos ficaram recolhidos, como todos os outros que, amorosos ou simplesmente ternos, minha imaginação ensaiou para as virgens que passaram pelo meu caminho". (pág. 71)
"O sertão estraga as mulheres e a pobreza as consome". (pág. 86)
"As coisas não estão no espaço; as coisas estão é no tempo. (...) Na verdade, as coisas estão é no tempo, e o tempo está é dentro de nós". (pág. 86)
"...Hoje dormimos arlequim, amanhã acordaremos pierrô. As vestes ficam guardadas num armário de nossas profundezas onde se amontoam indumentos de infinita variedade. Alguém no-las troca sorrateiramente, durante o sono, de acordo com um critério que nos escapa. (...) À sorrelfa, algum diabo malicioso inutiliza o nosso trabalho e amanhã seremos o que não queremos, e hoje, somos o que ontem fôramos e não quiséramos ser mais". (pág. 90)
"Já não reajo contra as visitas dessa doce imagem. Associei-a à minha vida, ela me pertence. A Carmélia real, inatingível, será de outro, casará, terá filhos. Mas a que construí será sempre minha, e o tempo não exercerá sobre ela sua ação desagregadora, porque está fora dos domínios do tempo". (pág. 134)
"No momento preciso em que certos quadros se desdobram aos nossos olhos, quase sempre não lhes percebemos a intensidade lírica, nem lhes aprendemos a substância rica de poesia. (...) Mais tarde é que, através da memória, vamos com os olhos da alma penetrar no âmago daquelas paisagens extraordinárias.
(...) Só hoje depois de uma ascensão lenta, as camadas profundas do espírito me trazem o panorama, a cor, a luz, e a música de longínquos dias, que pareciam perdidos". (pág. 153)
"Irritado comigo mesmo, perguntei-me se foi por 'aquilo' que viera ao Rio. Eram viajantes perfeitamente vulgares, como centenas de outros. E não aconteceu nada de excepcional. A terra não tremeu, nem houve eclipse do sol". (pág. 193)
"Como eu me aproximasse, para o livrar do incômodo apêndice, e ele ignorasse minhas intenções, pôs-se a correr como pôde, dando com a lata aqui e acolá, para tortura de um focinho possivelmente magro, a julgar pela miséria orgânica do resto do corpo". (pág. 201)
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